TERRORISMO OU APENAS ATIVISMO?
Justiça

TERRORISMO OU APENAS ATIVISMO?



ZERO HORA 13 de fevereiro de 2014 | N° 17703


SUA SEGURANÇA | Humberto Trezzi




A falta de uma legislação no Brasil que tipifique o terrorismo como crime é uma das maiores críticas que o país sofre no Exterior. E a Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) se alinham nessa queixa, como deixaram claro no Seminário Internacional sobre Terrorismo e Grande Eventos, promovido pelas comissões de Relações Exteriores da Câmara e do Senado no ano passado. É o ponto de vista de quem não acredita que o Código Penal, do jeito que está, possa punir atentados coletivos, algo sempre preocupante em países que sediam grandes eventos como a Copa do Mundo e a Olimpíada.

Em meio ao clamor para punir os responsáveis pelo morteiro que matou o cinegrafista Santiago Andrade, voltou a discussão sobre o projeto de lei de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), que apoia o governo Dilma Rousseff. Ele propõe que, na reforma do atual Código Penal, seja incluído um artigo específico sobre terrorismo, caracterizado como “provocar ou espalhar terror ou pânico generalizado com ofensa à vida, à integridade física, à saúde ou à liberdade do cidadão”.

Os condenados pelo crime de terrorismo sofreriam penas que vão de 15 a 30 anos de prisão. No caso de mortes, a pena inicial seria de 24 anos de reclusão e, se o terrorista usar explosivos, armas químicas ou outros recursos de destruição em massa, o tempo na cadeia poderia aumentar em um terço.

De imediato, surgiram reações entre petistas, que costumam votar junto com Jucá em projetos do governo. Os senadores do PT defendem que a tipificação de terrorismo exclua os movimentos sociais, para afastar o risco de que qualquer mobilização mais agressiva (como a dos black blocs) seja enquadrada como terrorista.

Jucá diz que o PT “não leu e não gostou” de seu projeto. Ele enfatiza que, se um movimento social explodir um avião ou um ônibus, vira terrorista.

Quem tem razão? A verdade é que o momento é péssimo para esta discussão, porque os ânimos estão exaltados, alerta o juiz Orlando Faccini Neto, professor da Escola Superior de Magistratura e pós-graduado em Lisboa. Agora radicado em Passo Fundo, durante muito tempo Faccini foi apontado como “perseguidor de movimentos sociais” devido a um caso espinhoso: as 14 invasões da Fazenda Coqueiros por parte do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Decretou prisões dos sem-terra, os autuou por formação de quadrilha, mas jamais fez uso da Lei de Segurança Nacional (LSN), a exemplo de colegas seus da esfera federal. Para quem não lembra: a LSN era usada pelo regime militar para reprimir seus opositores. Pois esse juiz, que já enquadrou ativistas sociais por crimes, é incisivo ao alertar: é preciso cautela na definição de terrorismo, a fim de que certas liberdades constitucionalmente asseguradas não acabem por ser reprimidas penalmente.

– Os atos de vandalismo e vilipêndio à vida e integridade das pessoas, ainda que praticados no contexto de manifestações, já são puníveis na forma de nosso Código Penal. A Constituição prevê, em seu artigo V, a tipificação de terrorismo, mas o momento atual, em que a triste morte do cinegrafista da Band acirra os ânimos de todos, talvez não seja o melhor para criar um crime com severas penas – disse ele a ZH.

Assino embaixo das palavras do juiz. A verdade é que o atual Código Penal já pune o terrorismo, sem tipificá-lo. A Lei de Crimes Hediondos prevê que autores de homicídio qualificado (como os que usam explosivos) só poderão progredir de regime (sair de trás das grades) após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente. Nada mal, para um país em que, via de regra, o sujeito cumpre atrás das grades apenas um sexto da pena a que foi sentenciado.



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