1930 x 1964
Justiça

1930 x 1964


<br /><b>Crédito: </b> ARTE JOÃO LUIS XAVIER
Crédito: ARTE JOÃO LUIS XAVIER  

JUREMIR MACHADO DA SILVA - CORREIO DO POVO, 15/06/2012

Tenho dedicado alguns anos da minha vida à história contemporânea do Brasil. Para não morrer de tédio, publiquei "Getúlio", um romance (para não mentir como fazem certos biógrafos sobre cenas como a do seu suicídio e o que ele teria pensado antes de puxar o gatilho), e "1930: Águas da Revolução", um romance sem ficção, pois a história é um romance muito mais interessante que grande parte da ficção umbilical produzida no Brasil. Recebo boas provocações que me instigam a comparar o golpe de 1964 com a Revolução de 1930. Na boa, vou de clichê mesmo, é como comparar água com vinho. O furo da bala chama-se legitimidade. O movimento de 1930 foi comandado por civis, com o apoio de militares, contra um regime baseado na fraude eleitoral. O golpe de 1964 foi deflagrado por militares, com o apoio de civis e estrangeiros, contra um governo legitimamente constituído. A origem dos movimentos sela seus destinos.

Getúlio Vargas passou no teste das eleições várias vezes. Foi deputado estadual e federal. Elegeu-se presidente do Rio Grande do Sul. Em 1930, ganhou a eleição, mas não levou por causa da fraude. Em 1950, Getúlio foi a campo novamente e deu uma lavada no candidato dos militares, o brigadeiro lacerdista Eduardo Gomes. Nenhum dos generais ditadores de 1964 foi ungido por voto popular. Seria mais adequado comparar 1937 e 1964. Em 1937, Getúlio deu um golpe de Estado e implantou uma ditadura. A partir daí, como aconteceu com 1964, todas as resistências ao seu governo tornaram-se legítimas. O Estado Novo foi um regime autoritário, violento e condenável. Torturou, matou e censurou. Getúlio, o ditador, merece e recebe as mesmas críticas que os generais de 1964. Acontece, porém, que há o Getúlio de 1930, o de 1937 e o de 1950. O de 1930 é revolucionário, o de 1937, ditador, o de 1950, um democrata. O de 1930 é um conservador modernizante, o de 1937, um conservador autoritário, o de 1950, um líder de centro-esquerda. Os generais de 1964 ficam esquálidos.

Há também a possível comparação dos legados. O de Getúlio, para usar uma linguagem esportiva, dá um chocolate no dos militares de 1964. Ninguém fez mais pela modernização do Brasil do que ele. O Getúlio do Estado Novo pode ser comparado ao Médici de 1970. Historiadores honestos não poupam críticas ao ditador Getúlio. Também não silenciam sobre seus outros períodos. Tornar 1930 e 1964 equivalentes significaria falsificar a história, considerar igualmente legítimos acontecimentos que nascem em situações diametralmente opostas. A questão é de princípio: a Revolução de 1930 tem a marca da revolta contra o arbítrio. O golpe de 1964 tem a marca do arbítrio. Há mais um aspecto interessante: 1964 foi feito contra 1930. Um golpe contra o legado getulista que estava sendo ampliado por Jango pela reforma agrária e pela legislação trabalhista estendida para o campo.

Nas ruas, praças e cidades com o nome de Getúlio Vargas, homenageia-se o revolucionário de 1930 ou o democrata perseguido de 1954, criador da Petrobras, não o ditador do Estado Novo. Getúlio conseguiu superar a sua imagem nefasta de ditador. A marca negativa desse período, porém, nunca será apagada e tampouco será defensável. A vida é assim, complexa e multifacetada.




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