A equipe do cineasta Paulo Nascimento, responsável pelo filme Em Teu Nome, que conta a história do ex-integrante da luta armada na ditadura João Carlos Bona Garcia (foto), chegou à Base Aérea de Canoas otimista, durante a pré-produção do longa. O objetivo parecia simples: fazer imagens do local, onde, em janeiro de 1971, o ex-guerrilheiro, preso e torturado pelos militares, foi trocado pelo embaixador da Suíça Giovanni Enrico Bucher, sequestrado pela Vanguarda Popular Revolucionária. Quando os oficiais que atenderam o grupo souberam que a gravação era para o filme sobre Bona, negaram:
– Aquele terrorista? Ele tinha de estar morto – disse um deles.
Para Bona, hoje com 67 anos, o episódio mostra um dos piores legados deixados pela ditadura à sociedade brasileira: a resistência dos militares em assumirem os erros cometidos no período.
– Os militares que atenderam o Paulo Nascimento eram jovens, não eram do Exército durante o regime. Como que eles poderiam dizer isso de mim, sem nem me conhecer?! Por que eles (militares) não assumem o que fizeram? Em outros países, como no Chile e na Argentina, as forças armadas reconheceram. Custa dizer? Não! – indigna-se.
Bona diz que as escolas militares suprimem dos ensinamentos as partes negativas do regime, o que faz com que os jovens estudantes e futuros soldados e oficiais não renovem o discurso encampado pela ditadura.
Após sofrer nas mãos dos torturadores e ser banido do país, Bona retornou ao Brasil em 1979 e mergulhou na política – concorreu a prefeito em Passo Fundo pelo PMDB e foi chefe da Casa Civil durante o governo Antonio Britto. Hoje, vive em um confortável apartamento no bairro Rio Branco, na Capital. Bem diferente dos locais onde se abrigou durante o exílio.
– Tive de começar do zero várias vezes, com um colchão e um fogareiro – lembra.
O ex-guerrilheiro também passou por uma experiência peculiar para alguém que lutou contra a ditadura ao ser nomeado, em 1998, juiz do Tribunal de Justiça Militar. A posse foi contestada pelos militares na Justiça, mas acabou mantida. Anos depois, Bona chegou à presidência da Corte.
– Foi uma experiência espetacular. Uma vez, em um evento, os militares viraram as costas para mim. Tentei sempre fazer o trabalho mais isento possível – conta.
O cinquentenário do golpe é a oportunidade, na opinião de Bona, de trazer à tona a memória da ditadura e valorizar a liberdade:
– Nosso país não cultiva a memória. Temos muito o que melhorar, mas as pessoas têm de entender que agora elas têm liberdade para pedir. Temos de valorizar isso.