O CAOS NA JUSTIÇA
Justiça

O CAOS NA JUSTIÇA


PAULO SANT’ANA - ZERO HORA 29/10/2011


Antes de assinar autógrafos num caderno de literatura patrocinado pela Ajuris, para o qual foi escolhida uma crônica minha, visitei na 3ª Vara Cível a juíza Jane Vidal, minha amiga.

Fiquei condoído, uma juíza tem somente, como quadro de funcionários, um assessor, uma secretária e uma estagiária.

Três funcionários em uma vara importante para receber 250 processos diários. A 3ª Vara Cível tem, portanto, 5 mil processos por mês para julgar. Três funcionários!

Eu imaginava que uma vara judicial contasse, no mínimo, com 18 funcionários.

Mas não, a precariedade é total em toda a Justiça Comum.

Mas nas Varas Cíveis não é nada, nas varas da Fazenda Pública, em cada uma, há cerca de 30 mil processos para julgar. E há a mesma necessidade alarmante de servidores.

Um caos e um colapso que só são atenuados pelo verdadeiro milagre que realizam os magistrados, fazendo das tripas coração para distribuir justiça.

Que me desculpem os magistrados, mas para meu público sou obrigado a opinar sobre a verdade.

E a verdade é que não se pode fazer justiça nesses termos.

Esta é a justiça da pressa, do açodamento. E só é lícito ter pressa na justiça os demandantes, os clientes, que têm sede de justiça e pressa portanto para obtê-la.

Como é que um juiz vai estudar 5 mil processos por mês, cuidando dos detalhes, esmiuçando as peças dos processos e ainda tem a incumbência de realizar audiências demoradas? Como é que pode?

Corre-se o risco da pressa e do açodamento. Risco que não se pode correr quando se trata de prestação jurisdicional, isto é, de prestação da Justiça.

Não há lógica em a sociedade inteira acorrer à Justiça em busca de justiça – e o lugar em que mais se acorre para buscar justiça no Brasil é o RS, segundo pesquisa recente – e lá encontrar pela frente algumas salas de uma vara completamente repletas de processos, e uma pobre juíza com três funcionários ter de dar conta de tudo isso?

Não pode, decididamente não pode.

Não sei como o Conselho Nacional de Justiça pôde declarar esses dias que a melhor de todas as Justiças brasileiras é a gaúcha. Mas com três funcionários em cada vara? Como será então no Sergipe?

A Polícia Civil gaúcha, como todos sabem, está quebrada, foi quebrada por sucessivos governos gaúchos nas últimas décadas, tanto que dispõe do mesmo efetivo de funcionários hoje que tinha há 40 anos.

Pois chegamos ao absurdo de que, com as delegacias da Polícia Civil vazias de funcionários, o que é reclamado por toda a população, tem mais funcionário em uma delegacia do que numa vara da Justiça.

Isso é um despropósito.

Olhando-se friamente para esse quadro de pessoal desolador da Justiça gaúcha, chega-se à conclusão de que o RS e o Brasil vivem um estágio primitivo de civilização.

E, apesar da minha alegria em visitar os pretórios, estragou-me o dia, na semana passada, em que fiz aquela visita.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Este é o problema de um poder de Estado, cujas mazelas vem desacreditando a justiça no Brasil, que só investe em salários, gastando nisso a maior parte do seu orçamento. Assim, faltam recursos para aumentar o número de varas de justiça, de juízes e de servidores para atender a crescente demanda. Como também faltam recursos para melhorar a estrutura do poder para reduzir a burocracia, agilizar os processos e dar continuidade ao esforço do Ministério Público, das forças policiais, dos defensores públicos, dos agentes prisionais e das pessoas que buscam na justiça a solução de suas divergências e direitos. Somando tudo, falta no Brasil vontade política de construir uma nova e enxuta constituição capaz de descentralizar a justiça e o transitado em julgado, harmonizar direitos e deveres, reduzir os benefícios e privilégios, integrar poderes e promover a paz social no país com uma justiça coativa e comprometida com a supremacia do interesse público.



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