Justiça
VÍTIMAS DO PRÓPRIO SUCESSO
16 de setembro de 2012 | 3h 05
OPINIÃO O Estado de S.Paulo Criados há quase três décadas para dar atendimento rápido às demandas da população de baixa renda e agilizar o julgamento de causas corriqueiras, aliviando a sobrecarga de trabalho da primeira instância das Justiças Estaduais e Federal, os Juizados Especiais estão vivendo uma situação paradoxal. Por causa de seu sucesso, não funcionam bem. Com alçada para dirimir litígios no valor de até 40 salários mínimos, em rito sumário, os Juizados Especiais atraíram mais causas do que podem atender. Por isso, eles se encontram abarrotados de processos e podem se tornar tão lentos quanto as varas da Justiça comum.
Somente em São Paulo tramitam mais de 2 milhões de processos nos Juizados Especiais Cíveis - a maioria envolvendo questões como pagamento de títulos, despejos e indenizações. Em 2002, eram 900 mil processos. Por causa do aumento da demanda, a primeira audiência de um processo nesses Juizados está sendo agendada para dezembro de 2013. Pela legislação que criou os Juizados Especiais, a primeira audiência teria de ser realizada no prazo máximo de três meses após a propositura da ação, e o caso tem de estar julgado em até seis meses.
Nos Juizados Especiais Federais, que lidam com questões de direito previdenciário e em cujo âmbito os campeões de reclamações são o Instituto Nacional do Seguro Social e a Caixa Econômica Federal, a situação é semelhante. Um levantamento recém-concluído pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, realizado por encomenda do Conselho da Justiça Federal, mostra que o tempo médio de tramitação dos processos relativos a cálculos de aposentadoria, índices de reajustes de pensões e contagem de tempo de serviço é de 1 ano, 8 meses e 22 dias. Segundo a pesquisa, os Juizados Especiais Federais com melhor infraestrutura estão na Região Sul e os piores, que funcionam em salas e galpões improvisados, na Nordeste.
Além da demanda ser maior do que a capacidade de atendimento, os Juizados Especiais enfrentam outros graves problemas. Muitos deles carecem de funcionários e magistrados suficientes para dar conta do crescente número de processos. Em vários Estados, a distribuição dos recursos financeiros é feita sem critérios. Apesar de alguns Juizados Especiais terem muito mais ações do que as varas comuns para julgar, eles recebem apenas entre 10% e 20% do orçamento que o Poder Judiciário dedica à primeira instância.
Entre 2006 e 2007, quando começou a mapear os gargalos do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) constatou que, em alguns Estados, os Juizados Especiais tinham apenas 10% do total de magistrados de primeiro grau e as varas comuns, 90%. Por causa dessa distorção, um juiz de vara comum recebia menos processos para julgar, enquanto os juízes dos Juizados ficavam abarrotados de processos. Na época, um estudo elaborado pelo Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais, com apoio do Ministério da Justiça, afirmou que essa desigualdade de tratamento era um reflexo do modo como a cúpula do Judiciário via os Juizados Especiais, encarando-os como uma "justiça de segunda classe".
Em 2010, quando constatou que alguns Juizados Especiais tinham acumulado até seis vezes o número de processos das varas comuns, o CNJ lançou um plano emergencial, exigindo o julgamento imediato dos processos já instruídos e criando uma Comissão de Reestruturação dos Juizados Federais. Cumprindo as determinações do CNJ, em 2011 o Tribunal de Justiça de São Paulo criou o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc), para estimular os litigantes a negociarem e disseminar a chamada "cultura de conciliação". Um ano depois, o Estado de São Paulo já conta com 40 Cejucs - e mais 2 devem ser abertos no início de 2013.
O sucesso dos Juizados Especiais Estaduais e Federais contribui para a consolidação da segurança do direito e do império da lei, além de democratizar o acesso ao Judiciário. É por isso que não se pode permitir que se tornem tão morosos quanto as varas comuns.
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