ÉTICA DO ABUSO
Justiça

ÉTICA DO ABUSO


 

ZH 19 de setembro de 2014 | N° 17927


JOSÉ PEDRO MATTOS CONCEIÇÃO



O Estado democrático-social é conquista da evolução do homem. O pensamento humanista, seja de base marxista, seja de fundo cristão, propugna por sociedade justa, com respeito à dignidade humana e proteção aos menos favorecidos. Houve um tempo de grandes disparidades sociais e econômicas entre cidade e campo. Hoje, os espaços urbanos abrigam as diferenças mais chocantes, pelo crescente grau de concentração em busca de sobrevivência e realização, nos países em desenvolvimento, como o Brasil. É fenômeno que data de algumas décadas, a partir do que se considera modernidade, isto é, desenvolvimento industrial, democratização do consumo e avanço tecnológico. Chegamos a um estágio que a Europa atingiu bem mais cedo, e que os EUA também alcançaram, sem o esplendor europeu, mas com impressionante estrutura cívica, organizacional e de aproveitamento de riquezas. Todos os países atravessam períodos de desajustes sociais. Afinal, as agruras do progresso são comuns. É o bom senso, a sensibilidade e o Direito que fornecem os instrumentos adequados para a superação dos males da evolução e não a ideologia ou a religião, que provocam atraso.

O Brasil é um país com ilhas de progresso de Primeiro Mundo. Falar sobre um país como um todo é difícil, tão árduo como explicar os contrastes sociais das cidades. Um dos grandes erros é acreditar possível prescindir de políticas de proteção aos menos aquinhoados, como se o mercado ou as leis naturais tivessem o condão de produzir justiça social. Outro, tão grave quanto, é fazer política pública com sentimento de culpa, como se o desvalido, ainda que permaneça sempre como tal, necessite de tratamento piedoso em qualquer circunstância.

Este falso humanismo é deletério para a vida dos cidadãos e para a organização dos polos de convívio. É inconcebível que um país que se pretende desenvolvido combine tímidas políticas sociais com proteção a vandalismo, invasores aloprados, moradores de rua – que conspurcam as cidades, apropriando-se de praças, calçadas e viadutos – ou de catadores de lixo que anulam a incipiente educação dos moradores urbanos, espalhando porcarias pelas calçadas e ruas, em absoluto estado de impunidade. Temos falhas institucionais e de estrutura, mas é preciso combater a demagogia, a acomodação, a negligência ou as ideias confusas de quem nos conduz. A cidade é para todos, habitantes e visitantes.

Advogado



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