Enquanto os 11 ministros estiveram concentrados no julgamento do mensalão, outros temas controversos e de impacto na vida das pessoas chegaram à mais alta Corte brasileira. Com o peso de uma história centenária, o STF terá de enfrentar questões atuais e delicadas, como a descriminalização das drogas. Sua palavra será decisiva.
Depois de concluir o mais longo julgamento de sua história, o Supremo Tribunal Federal (STF) não terá descanso. Há no horizonte uma pauta recheada de temas polêmicos e com influência na vida dos cidadãos: da descriminalização das drogas, passando pela forma de pagamento de precatórios, até o fim do financiamento privado de campanha.
Esses são alguns dos assuntos que podem ser levados para discussão no plenário neste ano, assim que a última rodada de recursos dos réus do mensalão for finalizada, o que deve ocorrer nesta semana. Na avaliação de especialistas, o STF dedicou muita energia ao julgamento da Ação Penal 470, o processo do mensalão, iniciado em agosto de 2012. Mas a página precisa ser virada.
Uma das consequências do esforço concentrado no mensalão são longas filas nos tribunais de instâncias inferiores, que estão com processos parados à espera de uma decisão do Supremo. Por exemplo: se os ministros julgarem os recursos que tratam de perdas na poupança decorrentes de planos econômicos implantados entre 1980 e 1990, cerca de 400 mil processos – hoje paralisados – podem ser solucionados.
– O STF deveria se focar em questões técnicas, de repercussão geral, que pudessem desafogar o Judiciário – avalia o professor de Direito da PUCRS e da UFRGS Juarez Freitas, que classifica a morosidade como “absolutamente dramática para a sociedade”.
Atualmente, tramitam no Supremo 65,3 mil processos, sendo que 724 estão aptos para o julgamento. As pautas das sessões, realizadas nas quartas e quintas-feiras, são definidas pela presidência do STF. Entre as prioridades, estão pedidos de habeas corpus e extradição, causas criminais, conflitos de jurisdição, recursos saídos do Tribunal Superior Eleitoral e mandados de segurança.
O ingresso de novos ministros – quatro dos 11 foram nomeados pela presidente Dilma Rousseff, e todos indicados pós-ditadura – também fortalece a tendência de um Supremo mais ousado em suas decisões, segundo o professor de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV-RJ) Diego Werneck. Ele lembra que, na década de 1990, o tribunal possuía um perfil mais tímido e uma postura mais restritiva, até porque a democracia estava em processo de consolidação.
Nos últimos anos, houve um processo inverso. O Congresso passou a acusar o STF de ultrapassar seus limites e legislar no lugar do parlamento. Apesar de a Constituição prever que a Corte atue diante de uma omissão do Legislativo, a queixa sobre uma suposta invasão de competência tem sentido, diz Werneck. Ele cita como exemplo a perda automática de mandatos dos réus do mensalão:
– O Supremo começa, por sua própria interpretação, a aumentar seus poderes. É importante que as pessoas se lembrem de que qualquer poder, em um Estado de Direito, precisa ser limitado. Conhecemos os limites dos poderes do presidente da República e do Congresso mais do que os limites do STF. Estamos em um momento de transição, e uma parte importante do debate daqui para frente é onde parar.
Se por um lado o julgamento do mensalão atrasou a análise de outros temas controversos, por outro encorajou a sociedade a ficar de olho nas sessões do STF. A tendência, dizem os especialistas, deve permanecer em 2014, o que é bom para todos.