DIVERGENTE - A Constituição "Cidadã" poderá bloquear a aplicação e o rigor da Lei da Ficha Limpa
Justiça

DIVERGENTE - A Constituição "Cidadã" poderá bloquear a aplicação e o rigor da Lei da Ficha Limpa



FICHA MAIS LIMPA - Editorial Zero Hora/RS - 21/06/2010

Mais uma vez, a Justiça acabou se revelando mais rigorosa em relação às exigências de moralidade na política do que o próprio Congresso. Na última semana, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que a chamada Lei da Ficha Limpa valerá para todos os candidatos condenados por crimes graves em órgãos colegiados, incluindo casos nos quais a condenação seja anterior à sanção da lei, em 4 de junho. Prevaleceu, portanto, a tese de que o Direito Eleitoral deve proteger a moralidade, e evitou-se assim o risco de o novo instrumento se tornar inócuo. Com essa manifestação da Justiça, perdem alguns políticos que, a partir da ampliação do alcance da lei, ficarão impedidos de concorrer em outubro e deverão, por isso, tentar derrubar a norma. Em compensação, ganham os eleitores, pois assim correrão menos riscos de eleger quem tem contas a acertar com a Justiça.

Mesmo levado a agir de alguma forma por um projeto de iniciativa popular apresentado em setembro do ano passado com o respaldo de 1,3 milhão de assinaturas, o Congresso vinha desde então hesitando em atender ao clamor popular. A aprovação só ocorreu depois do abrandamento do texto, que limitou o impedimento do registro de candidatura apenas para condenados em última instância. Mesmo assim, o Senado ainda tentou um recurso semântico para abrandar as exigências, mudando o tempo verbal “os que tenham sido”, como saiu da Câmara, para “os que forem” condenados.

Felizmente, na interpretação do TSE, prevaleceu a tese do relator da consulta sobre o projeto Ficha Limpa, ministro Cláudio Versiani, de que a causa da inelegibilidade incide sobre a situação do candidato no momento do registro, com prazo até 5 de julho. Não se trata, como argumentou o relator, de perda de direito político, de punição, pois inelegibilidade não constitui pena. A condenação é que, por si só, sob esse ponto de vista, impede alguém de sair em busca de voto.

Só o corporativismo dos políticos é capaz de justificar a necessidade de a Justiça Eleitoral se pronunciar, impedindo o registro de candidaturas que os próprios partidos deveriam vetar, em respeito aos eleitores. Confrontada com a exposição de sucessivos descalabros na política e na administração pública de maneira geral, a sociedade brasileira tem razões de sobra para se mostrar cada vez menos tolerante com práticas do gênero. Esse é o tipo de deformação que só se mantinha pelo fato de ter sido associada a políticos a ideia de impunidade e pela insistência de muitos deles em buscar votos para garantir imunidade ou tratamento privilegiado.

O projeto que o TSE se encarregou de tornar um pouco mais rigoroso pode não ser abrangente o suficiente para as necessidades do país e não confere 100% de garantia ao eleitor de estar optando por um candidato ético. Mas, diante da falta de disposição dos parlamentares em se mostrarem mais rigorosos, constitui um alento na luta pela moralização.


"Nunca vi maior inconstitucionalidade" - PAULO SANT’ANA, colunista de Zero Hora, 21/06/2010

Pela Lei da Ficha Limpa, aprovada recentemente pelo Congresso e referendada pelo Tribunal Superior Eleitoral, não poderão ser candidatos, já nas próximas eleições, todos aqueles políticos que tenham tido ou venham a ter condenação penal por órgão colegiado da Justiça, mesmo que a sentença não seja definitiva, ou seja, não tenha transitado em julgado.

Tenho lido há um mês, e mais ainda agora, um contentamento na imprensa e na opinião pública pela aprovação desta lei.

Recomendo que moderem esse contentamento, pela simples razão de que esta lei é completa e inequivocamente inconstitucional. E foi aprovada a toque de caixa para aplacar a ira da opinião pública contra a corrupção.

É inconstitucional porque o artigo 5° da Constituição Brasileira diz em um dos seus incisos que “ninguém poderá ser considerado culpado antes de sentença penal condenatória que transite em julgado”.

Nunca vi um texto mais claro a respeito de uma lei, considerando-a inconstitucional, como neste caso.

Não vale a alegação de que esta Lei da Ficha Limpa é um apêndice da Lei das Inelegibilidades e precípua para a eleição, tendo sido já referendada pelo TSE.

Não vale porque, quando a Constituição diz que ninguém pode ser considerado culpado antes de sentença condenatória, está afirmando que considerar alguém inelegível por condenação é em outras palavras considerá-lo culpado.

Esta lei vai cair no Supremo Tribunal Federal. Por sinal, um membro do Supremo fez parte também do Pleno do TSE e seu voto foi contrário e vencido quando aquela Corte examinou e convalidou a lei.

Marco Aurélio Melo vai ser apenas um dos votos que derrubarão esta lei no Supremo.

Hão de perguntar: por que o Supremo vai examinar uma lei que já foi carimbada pelo TSE?

A resposta é que os políticos que se tornaram inelegíveis por esta lei procurarão socorro no Supremo.

E, pela clareza da incongruência, a maioria dos ministros do Supremo será obrigada a considerar elegíveis os apelantes.

Sou a favor do espírito desta lei, que visa à moralização da vida política, mas infelizmente ela é sem dúvida alguma inconstitucional.

Nunca vi maior inconstitucionalidade.

O EXEMPLO - Garotinho vai ao TSE para tentar concorrer ao governo do estado do Rio de Janeiro - 20/06/2010 às 23h27m; O Globo

RIO - Depois de recorrer ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio, o pré-candidato ao governo do estado pelo PR, Anthony Garotinho, tenta agora no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reverter sua inelegibilidade. De acordo com o advogado dele, Jonas Lopes Neto, o ex-governador entrou, quinta-feira passada, com um pedido de medida cautelar no TSE para tentar suspender a decisão do TRE que impede sua candidatura. É o que mostra reportagem de Rafael Galdo publicada na edição do jornal O Globo.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA
- FICHA LIMPA É INCONSTITUCIONAL E SERÁ IMPEDIDA PELO STF. Infelizmente para o Brasil e para aqueles eleitores otimistas (será que ainda têm?), o Santana tem toda a razão. A nossa esdrúxula, benelovente, corporativista e toda remendada Constituição "Cidadã" fundamentará a decisão do STF de conceder habeas para os "ficha-sujas" concorrerem, pois não ocorreu o tal "transitado em julgado" onde os últimoas recursos são demandados exatamente na corte mais autoritária, centralizadora e morosa do país - o Supremo Tribunal Federal.



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