A NOBREZA TOGADA E O ANTIGO REGIME
Justiça

A NOBREZA TOGADA E O ANTIGO REGIME




CORREIO DO POVO, Porto Alegre, 14 de Junho de 2015


JUREMIR MACHADO DA SILVA


Tudo se repete. Como novidade.

A Revolução Francesa de 1789 foi um levante contra o Antigo Regime, que, na época, era o sistema de parasitagem dominante.


Os sans-culottes (sem-calças) revoltaram-se contra a nobreza que vivia na mamata. Os sem-calças não andavam de nádegas de fora, mas não usavam as calças coladas no corpo da aristocracia sem o que fazer. O símbolo da revolta contra a elite foi a tomada da Bastilha, prisão para onde eram enviados inimigos ou concorrentes da classe autorizada a praticar rapinagem. O jornalista Camille Desmoulins –– sempre tem um jornalista na parada –– alertou que se preparava uma repressão contra a plebe.

A turma dos camarotes achava que havia impunidade demais e clamava por mais segurança encarcerando os miseráveis.

A população tomou a Bastilha em busca de armas para combater o Antigo Regime. Conta a lenda que a rainha Maria Antonieta teria mandado, em 1775, o povo comer bolo na falta de pão. Tudo isso é conhecido. Mas o Antigo Regime não acabou. Continua existindo no Brasil. A nobreza verde-amarela é composta, entre outros, de vereadores, deputados, senadores e magistrados. Os vereadores de Porto Alegre autoconcederam-se a reposição integral da inflação de uma só vez. Aos funcionários sem-calças da capital a inflação será paga em parcelas. Os deputados estaduais do Rio Grande do Sul presentearam-se com uma aposentadoria especial indisponível para os gaúchos sans-culottes. O secretariado do governo estadual também garantiu o seu aumento privilegiado.

Os senadores vivem na corte sem temer cortes.

A nata do Antigo Regime redivivo é a magistratura, que deveria ter Maria Antonieta como patronesse. A magistratura não vai às ruas como vulgares sem calças para reclamar aumento salarial. Garante-se auxílios compensatórios com nomes generosos: auxílio-moradia, auxílio-educação, auxílio-alimentação e auxílio-creche. O privilégio é triplo. A própria nobreza julga a legalidade dos penduricalhos que se dá, não paga imposto de renda sobre esses acréscimos e só ela tem o direito de usar tal jeitinho brasileiro para aumentar os próprios proventos. O poder divino é o poder de nomear as coisas. Em certo momento, a aristocracia togada mudou o nome do seu salário. Passou a receber subsídios. Ganhou aumento com isso e escondeu os excessos que a indispunham com a plebe capaz de tomar a Bastilha. Quando deixou de ser interessante para os nobres, a noção de subsídios caducou.

Em 2013, a plebe foi às ruas e quase tomou a Bastilha no Brasil. Foi um sinal. Seria o Presídio Central a Bastilha de Porto Alegre? Não pretendo ser um novo Camille Desmoulins. Não quero parar na Bastilha. Muito menos no Central. Desmoulins perdeu a cabeça. Depois de insultar o Tribunal Revolucionário, foi guilhotinado, em 1794, pelo Novo Regime que ajudara a criar. Eu temo mais o Antigo Regime. Provocar a plebe sugerindo que coma bolo se não tiver pão é muito perigoso. A falta de senso de humor pode terminar em tragédia. Uma palavra levou à queda do Antigo Regime francês: igualdade. Anda fora de moda. A nova aristocracia sustenta que o mais importante é a liberdade. A plebe finge que acredita. Até quando?

Como a política vai mal, deputados resolveram aumentar seus mandatos. Faz sentido.

Toda farsa se repete como tragédia.



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