Justiça
RACISMO É A FOLHA EM BRANCO EM QUE O ÓDIO ESCREVE
JORNAL DO COMERCIO 20/03/2014
EDITORIAL
A questão do racismo aflora não apenas no Brasil, mas é relembrada e colocada em toda sua crueza em filmes quase épicos. Por exemplo, Lincoln, que mostra a saga do presidente dos Estados Unidos da América (EUA) que ousou acabar com a escravidão que sustentava, mediante torturas e enforcamentos, a economia baseada na produção de algodão no Sul daquele país. Também o filme 12 anos de escravidão, uma história real de injustiça terrível, se é que todas as injustiças não são terríveis. O fato é que os seres humanos não são uma folha de papel em branco em que a cultura e as idiossincrasias podem escrever o seu texto. Os seres humanos são uma entidade com toda uma carga própria de energia estruturada de determinadas formas. Por isso, ao ajustarem-se, reagem de maneiras específicas e verificáveis às condições exteriores. No Brasil, o estresse social é mais do que visível. Está sendo exteriorizado nas brigas de trânsito, nas demandas jurídicas, na dissolução familiar, nos crimes contra mulheres, nos latrocínios à luz do dia, nas greves à margem da lei e na desordem pública, contra a qual, se a polícia reage, é condenada. Se fica observando, é ainda mais criticada. Quando age com força para repelir o vandalismo, inexoravelmente machuca, no mínimo, os ditos manifestantes, na verdade, marginais travestidos de um bom-mocismo.
Claro que não podemos, não queremos e não devemos ter uma juventude acomodada. Triste do país em que os jovens julgam que tudo está certo e não propugnam por mudanças. A geração dos avós atuais participou das grandes mudanças nos anos de 1960, que começou com a música dos Beatles, passou pela queima de sutiãs, a pílula anticoncepcional, transformou as ruas de Paris em chamas e forçou o general Charles De Gaulle a se refugiar na ex-colônia francesa da Argélia. O mundo mudou, como muda ciclicamente. Por isso, os seres humanos não podem apenas se adaptar às condições exteriores autoplasticamente, modificando suas próprias naturezas como um animal.
Não somos capazes de viver sempre em um certo conjunto de condições com adaptações especiais. Ou, então, chegaríamos a um beco sem saída da especialização, que é o destino de toda espécie animal, bloqueando destarte o caminho para a História. Se, pelo contrário, a pessoa pudesse adaptar-se a todas as condições sem lutar contra as que se opõem à sua natureza, tampouco teria história. A evolução humana tem suas raízes na adaptabilidade das pessoas e em certas qualidades indestrutíveis de sua natureza que as levam a nunca cessar a procura de condições que melhor atendam às suas necessidades intrínsecas.
Brancos, negros, pardos, índios, mestiços, seja qual for a cor ou a raiz de nossa origem humana, todos temos olhos, mãos, órgãos, dimensões, sentidos, afeições e paixões. Somos alimentados pela mesma comida, feridos pelas mesmas armas, sujeitos às mesmas doenças, curados pelos mesmos meios e medicamentos, esfriados e aquecidos pelo inverno e o verão, não importa qual a cor da nossa pele ou a nossa religião. Devemos, pois, manter normas e valores válidos para todos os seres humanos, sem qualquer distinção. Da Crimeia até as favelas do Rio de Janeiro.
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