LEIS MAIS RÍGIDAS PARA CONTER VIOLÊNCIA EM PROTESTOS
Justiça

LEIS MAIS RÍGIDAS PARA CONTER VIOLÊNCIA EM PROTESTOS


Beltrame sugere leis mais rígidas para conter violência em protestos. Secretário de Segurança propõe a proibição do uso de máscaras e a tipificação dos crimes de desordem e associação

VERA ARAÚJO
JÚNIA GAMA 



O GLOBO
Publicado:11/02/14 - 5h00

Secretário de Segurança propõe que a sociedade discuta a violência que vem ocorrendo durante os protestos Paula Giolito / Agência O Globo (06-12-2013)


RIO e BRASÍLIA — Um projeto de lei elaborado por uma comissão de juristas convidados pelo secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, para tipificar o crime de associação para a incitação ou prática de desordem está há três meses em análise no Ministério da Justiça. Para Beltrame, a polícia fica de mãos atadas enquanto não houver leis mais rígidas. Ele propõe que a sociedade se engaje na aprovação da proposta, que inclui a proibição do uso de máscaras durante os protestos. Ainda esta semana, Beltrame vai apelar para outro caminho, levando a proposta ao relator da comissão que analisa projetos de segurança pública do Congresso, Pedro Taques (PDT-MT).

— Qual é o grau de tolerância que a sociedade tem com a violência apresentada durante as manifestações? Só para dar um exemplo, a pessoa que foi presa com o artefato já havia sido presa três vezes. As idas à delegacia não foram suficientes para ela repensar seus atos. Ela voltou a praticar crimes. A dificuldade que a autoridade policial tem de mantê-la presa passa pela aprovação de uma lei mais voltada para a prática da desordem, o que foge da minha alçada — afirmou Beltrame.

No dia 22 de novembro do ano passado, o secretário procurou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para entregar uma minuta de projeto de lei com a proibição do uso de máscaras e do porte de armas ou de objetos que pudessem causar lesão. Além disso, o texto sugere uma nova redação para os artigos 287-A e 288-B do Código Penal, que tratam de crimes contra a paz pública. O primeiro estabelece penas de dois a seis anos, além de multa, para quem pratica a desordem em lugar público, agredindo ou cometendo qualquer ato de violência física. Se este resultar na morte de alguém, a pena será de seis a 12 anos. O artigo 288-B prevê reclusão de três a seis anos quando três ou mais pessoas se associarem com o fim de praticar desordem, vandalismo ou qualquer tipo de violência.

A ideia de preparar um projeto de lei surgiu após os protestos contra a Copa das Confederações, em junho de 2013.

— As manifestações surgiram no ano passado de uma maneira que nunca havíamos visto. Gente mascarada utilizando pedras, coquetéis molotov, rojões, foguetes, estilingues incendiários. Temos tentado viver um protesto de cada vez, complementando com informações da nossa inteligência e treinando os policiais. Em função do que temos hoje na lei, não temos condições de manter estas pessoas presas e puni-las, porque os crimes são de menor potencial ofensivo. Temos prendido muita gente, foram cerca de 50 na última quinta-feira, mas todos foram soltos. Fizemos o estudo para propor as mudanças legislativas para evitar que isso ocorra — disse o secretário, que, com base em relatórios sigilosos do setor de inteligência, prevê protestos mais violentos em março.

Segundo Beltrame, se a proposta tivesse se tornado lei no ano passado, provavelmente o tatuador Fábio Raposo, acusado de passar o rojão que matou o cinegrafista Santiago Andrade, estaria preso ou respondendo a inquérito:

— Eu respeito o Ministério da Justiça, mas não posso deixar que as coisas continuem acontecendo aqui, nas minhas costas, na Central do Brasil (onde ocorreu o protesto da última quinta-feira). A própria Constituição garante o direito de manifestação, mas veda o anonimato e a utilização de armas durante os protestos. Estamos só pedindo para regulamentar algo previsto na Constituição há 30 anos. Precisamos ser rápidos, pois temos a Copa do Mundo à nossa porta.

Apelo por apoio de Dilma

Sobre a oferta da presidente Dilma Rousseff, de colocar a Polícia Federal para investigar os culpados da morte do cinegrafista, Beltrame disse que o apoio à aprovação de qualquer lei, seja ou não a proposta por ele, é a maior ajuda que o governo federal poderia dar à sociedade:

— Que bom que ela (Dilma) ficou sensibilizada. Acho que melhor maneira de a presidente ajudar à sociedade agora seria a de apoiar nossa proposta de lei. Temos que proibir o uso de máscaras para coibir a violência. Nosso projeto de lei está pronto e deveria entrar logo na pauta do Congresso. Isso, sim, daria muito mais segurança a todas as pessoas que estão na ruas, seja ativista, seja policial, seja imprensa.

O Ministério da Justiça informou que a proposta de Beltrame está sob análise, juntamente com um conjunto de sugestões recebidas pelo governo para enfrentar e coibir a violência em manifestações. De acordo com o ministério, Cardozo se comprometeu a enviar ao Congresso projeto de lei com medidas para aperfeiçoar a legislação.

No Senado, outro projeto em trâmite tipifica o crime de terrorismo. Ele começou a ser discutido em junho de 2013, auge das manifestações, sendo aprovado em novembro na comissão do Congresso que regulamenta dispositivos da Constituição. Após receber a nota de repúdio a agressões a profissionais de imprensa, do Conselho de Comunicação Social do Congresso, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou que o projeto entrará na pauta até a próxima semana:

— Se você pune levemente, passa a ideia de que o crime compensa, e o crime não compensa.

Presidido pelo arcebispo do Rio, dom Orani Tempesta, o Conselho aproveitou a reunião de ontem para reforçar a defesa da federalização das investigações desses casos e sugerir às entidades representativas de trabalhadores e empresários da área de comunicação que “busquem, conjuntamente, ações para garantir aos jornalistas, radialistas e demais comunicadores condições de trabalho e de segurança”. Segundo a nota do Conselho, a agressão a Santiago revela “comportamentos autoritários de pessoas ou grupos de pessoas que não conseguem conviver com o Estado de direito e, principalmente, com a comunicação pública. Ou ainda a ação equivocada do Estado, por meio de suas polícias que, em vez de proteger os jornalistas e outros comunicadores, tentam impedir seu trabalho.”




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