FOI GOLPE. NÃO FOI GOLPE
Justiça

FOI GOLPE. NÃO FOI GOLPE


ZERO HORA, 26 de junho de 2012 | N° 17112. ARTIGOS

Foi golpe, por Antonio Roberto Vigne*


Conhecido por sua fronteira alfandegária e por preços de produtos que fazem por vezes uma competição desleal aos comerciantes brasileiros, por conta de baixos impostos ali pagos, o que acaba por tornar os produtos altamente competitivos e promover muitas excursões dos chamados sacoleiros ao país, o Paraguai pode começar a ser conhecido por um outro termo daqui para diante, “democracia paraguaia”, o que explicaria e justificaria a conduta falsa, tal qual muitos de seus produtos comercializados ali na fronteira, oriundos em muitos casos da China, conhecida por desenvolver cópias de produtos famosos no mundo.

O comércio desses produtos chineses, por vezes, é atravessado para o Brasil via Paraguai, uma forma de corrupção não só aceita por muitos, pois sonega impostos, como estimulada por tantos outros, que compram os produtos, mesmo sem garantia alguma. É o barato que sai caro, pois no momento em que eles possuem vida útil baixa e baixo padrão de qualidade, logo ficam sem o produto e sem o dinheiro. Mas, com isto, alimentam a corrupção, a sonegação fiscal, a pirataria e até o tráfico, só combatido pelos setores corretos da Polícia Federal e Ministérios Públicos, sim, porque até eles foram afetados nesta situação, infelizmente.

Agora, a “democracia paraguaia” surge-nos, não como preconceito xenofóbico de uma nação ou povo sobre outro, como alguns de seus políticos podem querer passar ao seu povo, mas como um golpe de Estado e um atentado contra a democracia de fato e de direito e que em momento algum pode ser reconhecido como autêntico e legítimo, visto que é pífia a alegação que depôs um presidente eleito, até mesmo ideológica, é um golpe danoso para toda a América Latina, que cada vez mais se consolida, não como um continente democrático, mas um continente de republiquetas ditatoriais golpistas.

Doravante, tamanha é a vergonha que isto causará à comunidade política internacional, que os famosos produtos paraguaios deixarão de ser a temática principal desse país. Agora, será conhecido pela famosa “democracia paraguaia”, que sacrifica o direito de todos, conquistado pelo voto, para privilegiar o direito dos interesses de um grupo ou de alguns grupos ideológicos. Quem perde com isto é toda a América Latina, é o Mercosul.

A frase “pensar globalmente e agir localmente” não foi aí empregada, pois a disputa de poder interna do país não se importou com o que os outros pensam ou deixam de pensar. De fato, isto até lembra um pouco o caso do presidente brasileiro João Goulart (Jango), que em uma viagem para a China foi deposto de seu cargo no Brasil em um golpe político. Lá no Paraguai, foi a Rio+20 para o Fernando Lugo que abriu as condições de bastidores para essa ação, no apagar das luzes. Legal e moral? Sim, pode ser! Legítimo, ético e democrático, não, com certeza não!

*Cientista político

ZERO HORA, 26 de junho de 2012 | N° 17112. ARTIGOS

Não foi golpe, por Fábio Ostermann*


Expressões como “golpe branco” ou “golpe institucional” têm sido utilizadas para descrever os acontecimentos da última sexta-feira no Paraguai. Mas referir-se à atuação do parlamento paraguaio como golpista é ignorar os fatos e as instituições democráticas paraguaias.

Dado o histórico de golpes e ditaduras, o legislador constituinte paraguaio buscou, por meio da Constituição de 1992, frear a tendência à hipertrofia do Poder Executivo dando ao Legislativo a possibilidade de julgar politicamente e destituir o presidente em caso de atos contrários à lei ou à conveniência nacional. Assim, com base no Art. 225 da Constituição, o processo de impeachment de Fernando Lugo foi instaurado e julgado por margens esmagadoras (76 a 1 e 39 a 4) de votos dos representantes legítimos do povo paraguaio, atuando conforme os ritos legais.

Sendo o Paraguai uma república constitucional baseada em um regime de democracia representativa, não cabe questionar a legitimidade da atua-ção do Congresso no caso. Os senadores e deputados foram eleitos pelo povo e atuaram conforme a Constituição. Por questões históricas, a carta política do Paraguai estabelece um freio maior aos poderes presidenciais. Nada que Lugo não soubesse quando, motivado por um misto de arrogância e ingenuidade, optou por governar autonomamente sem ligar para o Poder Legislativo.

Se Lugo sofreu golpe, como têm afirmado alguns defensores casuístas de uma suposta “legalidade supraconstitucional”, precisamos rever também um capítulo importante da história brasileira. Afinal, o processo de impeachment que derrubou Collor ocorreu sem que houvesse qualquer sentença judicial transitada em julgado. Apesar de sentença absolutória posterior, o impeachment de Collor se manteve, condenando-o à perda de direitos políticos por oito anos. E ninguém em sã consciência defende hoje a tese de que o “caçador de marajás” tenha sofrido um golpe.

Tal tese serve apenas aos interesses dos legalistas de ocasião, que – monumentos à incoerência! – não perdem uma oportunidade de defender como legítimas medidas que levem à destruição da democracia por meios (supostamente) democráticos, como vem sendo o caso de Chávez, Morales e Correa. A crise institucional pela qual passa o Paraguai representa um risco, mas pode servir como uma oportunidade para o fortalecimento da democracia, da separação dos poderes e do Estado de direito, afastando-o do populismo bolivariano promovido por Fernando Lugo.

*Consultor, associado do Instituto de Estudos Empresariais (IEE)



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