DRIBLE NO JUDICIÁRIO
Justiça

DRIBLE NO JUDICIÁRIO




O Estado de S.Paulo 03 de março de 2014 | 2h 05

OPINIÃO



Ganha terreno no debate público a ideia de que os conflitos fundiários devem ser resolvidos à margem da lei - e, muitas vezes, ao arrepio dela. Sob o gelatinoso argumento da "questão social", defende-se que a propriedade, por mais documentada que seja, nada vale ante a urgente necessidade de "reparação histórica", o que obrigaria os proprietários formais a restituir a terra àqueles que seriam seus "legítimos" donos - índios e quilombolas. Se tal ideia fosse subscrita apenas pelos ditos movimentos sociais, amparados por suas convicções socialistas, não haveria nenhum problema, uma vez que, numa democracia, é lícito defender qualquer ponto de vista, inclusive os esdrúxulos. No entanto, gente graúda do governo federal resolveu apoiar essa flagrante ilegalidade, travestindo-a de "justiça" - não a Justiça institucional, que garante o Estado de Direito, e sim aquela que aparece nos gritos de guerra dos invasores de terra.

Em recente evento em Brasília, um seminário intitulado "Conflitos Fundiários em Debate", o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, corroborou uma tese segundo a qual as disputas por terra entre seus legítimos donos e os chamados "povos tradicionais" que a reivindicam deveriam ser resolvidas não mais no âmbito do Judiciário, e sim por meio de "mediação". Ele chegou a defender a criação de uma "escola de mediadores".

Também presente ao encontro, um importante funcionário do Ministério da Justiça, o secretário de Reforma do Poder Judiciário, Flávio Caetano, declarou que é preciso "mudar a cultura jurídica do País, que é a cultura do processo, do litígio" - como se o legítimo proprietário da terra não tivesse o direito óbvio de recorrer à Justiça para se queixar de quem a invadiu.

A opinião de Carvalho e de Caetano respaldou-se em estudos das organizações não governamentais Instituto Pólis e Terra de Direitos, ambas dedicadas a cobrar a regularização de territórios que, em sua visão, pertencem a índios e quilombolas. Em tais pesquisas, encomendadas pelo Ministério da Justiça, a retórica é poética - um dos relatórios diz que o objetivo é "construir um caminho dialógico para a democratização da justiça" -, mas, na prática, o palavrório a respeito de "mediação" significa criar maneiras de driblar o Judiciário para favorecer os "povos tradicionais".

Em seu discurso no seminário, Carvalho chegou a lamentar que o "aparelho de Estado" brasileiro, a começar pelo Executivo, que ele representa, seja obrigado a cumprir a "tarefa ingrata, inglória" de fazer valer o que está na lei, mesmo uma lei com a qual "sabidamente nós não podemos estar de acordo". O ministro disse ainda que "há uma mentalidade no aparelho de Estado que se posiciona claramente contra tudo aquilo que é insurgência", como se não fosse obrigação do Estado combater aqueles que ameaçam a ordem democrática. Carvalho expressa, assim, um mal-estar do governo em relação ao próprio Estado de Direito.

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) não demorou a se manifestar a respeito desse absurdo. Dizendo-se "perplexa", a entidade expressou especial preocupação com "a defesa, por autoridades, da submissão de conflitos de enorme complexidade a mediadores ideologicamente comprometidos, em substituição a magistrados imparciais, protegidos por garantias constitucionais e selecionados com impessoalidade, por meio de rigorosos concursos públicos".

A respeito das tais "escolas de mediadores" sugeridas por Carvalho, a CNA observou que o ministro não esclareceu "qual será o currículo e quem serão os professores desses futuros substitutos de juízes". Nem é preciso muita imaginação para supor que tal escola teria como cartilha os alegados direitos históricos dos índios e dos quilombolas sobre as terras.

Tem razão a CNA ao reagir com firmeza. O governo federal tem sido omisso em relação às ordens judiciais para a reintegração de posse de terras invadidas por supostos índios - como acontece neste momento no sul da Bahia -, e agora apela à antropologia de botequim para questionar o próprio direito constitucional à propriedade.



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