Justiça
A CHACINA AMPLIFICADA
EDITORIAL ZERO HORA 17/04/2011O massacre de estudantes no Rio de Janeiro, no último dia 7, provocou um grande debate nacional que envolve múltiplos aspectos, entre os quais a segurança nas escolas, o bullying, a política de comercialização de armas no país, as perturbações mentais, o fundamentalismo de inspiração religiosa e, também, o tratamento dispensado pela imprensa a episódios desta natureza. O crime provocou tanto horror e perplexidade, que nenhuma explicação parece ser suficiente para aplacar o inconformismo coletivo. No que se refere à imprensa, as reações são as mais variadas. Algumas pessoas não querem mais sequer ouvir ou ler notícias a respeito do assunto, outras aproveitam o momento de indignação para atacar indiscriminadamente a mídia e há também aqueles que, de forma lúcida e sensata, questionam-se sobre a real dimensão a ser dada a um fato de tamanha repercussão.
Em tese, é fácil dizer que o dever do jornalismo é informar a verdade aos cidadãos, sempre com responsabilidade e com foco no interesse público. Na prática, porém, alguns limites podem ser ultrapassados – com consequências imprevisíveis. A divulgação dos vídeos em que o matador de Realengo justifica sua atitude insana, por exemplo, localiza-se nesse ponto de inflexão, que tanto pode ser defendido como legítima informação complementar quanto como atenuante para a monstruosidade. É inegável que as pessoas queriam saber o que moveu o matador a fazer aquilo, mas seus argumentos só ajudam a aumentar a revolta.
Não para todos: já foram identificadas no site de relacionamento Orkut várias comunidades de apoio ao assassino e de defesa de ações radicais e práticas violentas. São verdadeiras apologias ao crime – delito previsto no Código Penal, que pode ser punido com pena de detenção ou multa. Ainda assim, fica a dúvida: os autores de tais manifestações são mesmo pessoas potencialmente perigosas ou estão agindo de forma irresponsável com o intuito de chamar a atenção?
A ânsia por visibilidade também pode estar na origem do hediondo crime praticado na escola de Realengo. Tanto os depoimentos gravados pelo assassino quanto suas confusas anotações reforçam a suspeita de que ele planejou a chacina com o propósito de conquistar um destaque que nunca teve na vida – o que, efetivamente, conquistou. Nesse sentido, até mesmo jornalistas mais calejados vêm se questionando sobre a dimensão da cobertura nos diversos veículos de comunicação. Diante da brutalidade do fato, é natural que todos tenhamos dúvidas sobre como agir e como reagir em relação ao episódio. Acreditamos, porém, que a discussão é sempre mais construtiva do que o silêncio, pois o debate traz à luz as imperfeições humanas e possibilita suas correções. A censura e a autocensura só servem para acobertar o mal.
Acreditamos que a discussão é sempre mais construtiva do que o silêncio, pois o debate traz à luz as imperfeições humanas e possibilita suas correções.
O editorial acima foi publicado antecipadamente no site de Zero Hora, na sexta-feira. Os demais comentários de leitores sobre a opinião desta página estão em zerohora.com/blogdoeditor. A questão proposta aos leitores foi a seguinte: Você concorda que as informações sobre um crime hediondo ajudam a prevenir outros?
LEITOR CONCORDASim, serve de alerta para as escolas, através de seu serviço de orientação pedagógica, professores e direção, agirem ostensivamente quando há ocorrências de bullying na escolas, reprimindo-as. Luciane Mattos – Porto Alegre
Sempre contribui, pelo menos enquanto os fatos estão em evidência. Serve como um alerta momentâneo até chegar o esquecimento ou ser substituído por outro fato. A prevenção é a melhor forma para evitar o pior, mas para isso devemos ousar em termos de segurança. Em nosso país, segurança de qualidade e quantidade é privilégio de nossos governantes e familiares. Renato Mendonça Pereira Alvorada (RS)
A divulgação do fato ajuda a prevenir outros delitos semelhantes que possam vir a ocorrer, pois poderemos ver em nosso meio conhecidos, parentes, amigos, algum com tal tendência e procurar a ajuda necessária para evitar. Sérgio Comacette – Porto Alegre
O LEITOR DISCORDADiscordo de que a notícia de um crime hediondo ajude a prevenir outros. Acho que a notícia só piora a situação porque “dá ideias” a pessoas mal-intencionadas ou transtornadas. Acho que o que a mídia faz é se aproveitar da desgraça alheia para ganhar dinheiro. Maria Silva – Porto Alegre
Não concordo. Cada caso é um caso! O problema maior é que muitos se acham conhecedores de algo, e não obedecem, desrespeitando o que poderia ser uma solução a cada caso. Infelizmente, o ser humano esqueceu das formas de vida planetária, onde tudo está ligado e dependem uns dos outros! Cláudio Fortes Carpes – Nova Prata (RS)
Assim como notícias de outros crimes provavelmente incentivaram o autor do massacre no Rio de Janeiro, a repercussão do caso pode também acabar por influenciar outros crimes. No entanto, a partir de agora se dará muito mais atenção à questão da segurança das escolas, o que, porém, não basta ser feito apenas enquanto o caso tem seu espaço na mídia! Camila Borges – Guaíba (RS)
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - CONCORDO Plenamente. Estudar as causas e vislumbrar os efeitos são modos de prevenir, e assim evitar ou minimizar a ocorrência. Infelizmente vivemos num país onde as medidas são adotadas no clamor dos fatos, no imediatismo e de forma superficial e desestruturada, sem diagnóstico e potencial humano para impedir as causas e operacionalizar o necessário exigido pela demanda. ESTE fato em particular pode proporcionar um grande debate e ações efetivas para a segurança da comunidade escolar; medidas preventivas contra o bullying; criação de uma Polícia de Fronteira para impedir o tráfico de armas e munições; controle do comércio, uso e porte de arma; justiça rápida e penas rigorosas contra quem for autuado com arma ilegal; criação de centros de tratamento das dependências e perturbações mentais; monitoramento dos focos de fundamentalismo de inspiração religiosa. Quanto à imprensa, julgo importante a difusão destas matérias para prevenir, denunciar, apontar problemas e fomentar o debate na sociedade e reação do Estado.
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