Justiça
O CLAMOR PÚBLICO
"Não se pode negar a realidade do clamor público" - Por Fernando Porfírio, Consultor Jurídico, 17/02/2011
O clamor público pode legitimar a prisão provisória? Essa questão foi levantada nesta terça-feira (15/2), durante o julgamento do Habeas Corpus em que se pedia a revogação da prisão cautelar de um casal suspeito de autoria de duplo homicídio triplamente qualificado. O caso foi apreciado pela 16ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo.
O Tribunal disse não à questão levantada, mas ponderou que há casos em que a prisão processual para a garantia da ordem pública é medida necessária. Sustentou, ainda, que nesses casos, a medida extrema não sinaliza prejulgamento ou antecipação da pena. No julgamento prevaleceu o entendimento de que a vontade do povo nem sempre é a vontade a lei, mas que não se pode negar a realidade do clamor público.
"Não há dúvida que o julgador deve enxergar além do que vê e pretende a população, em sua grande maioria desconhecedora dos preceitos legais e da verdade contida nos autos", defendeu o relator do Habeas Corpus, desembargador Almeida Toledo.
No entendimento da turma julgadora, a prisão cautelar do casal para a garantia da paz e da ordem públicas é medida apenas processual. Ainda segundo os desembargadores, também não configura abuso de poder ou ilegalidade por parte do juiz de primeiro grau que assinou o decreto, porque outros motivos, além da ordem pública, estão presentes na decisão.
Para o relator Almeida Toledo, o Judiciário não pode fechar os olhos ao clamor público, na medida em que o juiz como homem de seu tempo, deve estar atento — mas não influenciado — às necessidades sociais de segurança e credibilidade das instituições responsáveis pela manutenção da paz.
O caso
A advogada Roberta Nogueira Cobra Tafner e seu marido, Willians de Sousa, são apontados pelo Ministério Público como autores da morte do empresário Wilson Tafner e da advogada Tereza Cobra. O crime aconteceu em 2 de outubro. Wilson e Tereza são pais de Roberta. As vítimas foram mortas a facadas, enquanto dormiam, em sua casa, em Alphaville.
Os dois estão presos desde a segunda metade de dezembro. O casal foi apontado como o principal suspeito do crime, depois que a Polícia descartou a hipótese inicial de roubo seguido de morte. Antes do delito, Roberta teria deixado o escritório da mãe, no qual trabalhava, depois de uma briga, passando posteriormente a pedir 30% das empresas do pai. A Justiça autorizou o sequestro de bens e bloqueio dos direitos de herança da advogada.
O casal responde a Ação Penal suspeito de matar os parentes por interesse na herança e nos seguros de vida das vítimas, o que caracterizaria a figura do motivo torpe. De praticar o crime por meio cruel, com vários golpes de faca, o que provocou grande sofrimento físico e moral. E, por último, de ter praticado o delito de surpresa, à noite, quando as vítimas dormiam.
Acusação X defesa
O tema do clamor público foi levantado pela defesa que apontou entre seus argumentos o de que a prisão cautelar era medida "extrema" e "desnecessária", diante das condições favoráveis aos suspeitos, que apresentam bons antecedentes, são primários e tem residência fixa e trabalho lícito.
A defesa sustenta que seus clientes sofrem constrangimento ilegal por parte do juiz da 1ª Vara Criminal de Barueri. Os advogados se rebelam contra o decreto cautelar e pede a sua revogação.
O argumento é o de que não há prova cabal da autoria do crime nem justificativa para suprimir a liberdade dos acusados, que são primários, de bons antecedentes e com residência fixa e trabalho lícito. Alegam ainda que o decreto prisional está desprovido de fundamentação válida.
A defesa ainda sustenta o princípio da presunção de inocência e a excepcionalidade da medida de prisão preventiva. Os advogados afirmam que a medida foi desnecessária, pois durante toda a investigação o casal colaborou com apuração dos fatos. Para eles, a gravidade abstrata do crime não justifica, por si só, a privação da liberdade para a garantia da ordem pública.
Subsidiariamente, a defesa ainda pediu que, no caso de Roberta, que é advogada, fosse cumprido o inciso 5º, do artigo 7º, do Estatuto dos Advogados, que dá direito à acusada de cumprir o decreto de prisão em "sala de estado maior". Nesse último caso, o Tribunal manteve a liminar que permite a advogada cumprir o decreto de prisão conforme determina o Estatuto dos Advogados.
O Ministério Público — por outro lado — alegou que soltura dos suspeitos causaria desprestígio ao Judiciário e contribuiria para o agravamento da sensação de "impunidade", "lassidão" e "ineficiência" do poder público.
Decisão
Os desembargadores Almeida Toledo, Souza Nucci e Alberto Mariz de Oliveira defenderam a necessidade da prisão cautelar para a garantia da ordem pública, da conveniência da instrução criminal e para a segurança da aplicação da lei penal. Para a turma julgadora, a gravidade dos crimes revela a periculosidade dos acusados e justificam a medida imposta ao casal.
A turma julgadora entendeu que a proteção da paz pública não está condicionada apenas a reiteração criminosa, muito menos a existência de movimentos, levantes ou revoltas barulhentas da comunidade. Mas concluiu que, no caso, a revogação da custódia cautelar só iria contribuir para manter em risco a tranquilidade social.
Durante o julgamento, os desembargadores fizeram um paralelo do caso apreciado com outros de enorme apelo e comoção social e repercussão. Para os julgadores, a suspeita envolvendo o casal acontece sem que se ouça palavras de ordem e de clamor por justiça e que a sociedade acompanha o desfecho no mais completo silêncio.
Habeas Corpus 990.10.580363-6, de Barueri
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