Ao rejeitar o pedido adicional de recursos enviado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para reajustar os salários dos ministros e serventuários técnicos em 2015 e criar novos cargos de confiança e funções comissionadas no quadro de pessoal da Corte, o Executivo voltou a entrar em rota de colisão com o Judiciário. A pendência é antiga e os argumentos continuam os mesmos.
Invocando o princípio da independência dos Poderes, os presidentes dos tribunais superiores alegam que cabe ao Congresso - e não ao Executivo - deliberar sobre as prioridades do Orçamento da União. Encarregado de elaborar a peça orçamentária do próximo ano, o Ministério do Planejamento afirma que não há recursos disponíveis para reajustar os vencimentos da magistratura federal e de seus serventuários, que estão entre as corporações mais bem remuneradas na administração pública.
Dos R$ 154,9 milhões adicionais pedidos pelo Supremo para 2015, o Executivo só incluiu R$ 5,5 milhões na proposta orçamentária. O corte inviabilizou o aumento de salário dos 11 ministros da Corte, que teria efeito cascata sobre os vencimentos de todos os juízes federais, procuradores da República e defensores públicos federais, ampliando significativamente os gastos de pessoal do Judiciário, da Defensoria Pública da União, do Ministério Público da União e do Tribunal de Contas da União. Pelos cálculos do Ministério do Planejamento, o pedido adicional de "apenas" R$ 154,9 milhões, feito pelo STF, teria um impacto de R$ 16,9 bilhões no Orçamento da União em 2015.
Pela legislação em vigor, os salários dos ministros dos tribunais superiores correspondem a 95% dos vencimentos dos ministros do Supremo. Já os salários dos desembargadores federais e trabalhistas correspondem a 95% do valor pago aos ministros dos tribunais superiores. Por sua vez, a magistratura federal de primeira instância recebe salário 5% menor que os pagos aos desembargadores.
Em resposta à decisão do Ministério do Planejamento, o diretor-geral do STF, Amarildo de Oliveira, enviou ofício à Procuradoria-Geral da República, pedindo providências jurídicas para pressionar o Executivo a voltar atrás nos cortes. "Tais supressões impõem severos obstáculos ao bom desenvolvimento de condições adequadas para que o Supremo exerça sua missão institucional com a maior eficiência", disse ele. Por seu lado, o ministro mais antigo da Corte, Celso de Mello, considerou "absolutamente inconstitucional" o corte aplicado pelo Executivo nas pretensões orçamentárias da Justiça.
Segundo ele, o Ministério do Planejamento não teria competência jurídica para promover cortes unilaterais nos pedidos de recursos encaminhados pelos tribunais e pelo Ministério Público. "O juiz é o Legislativo. Ele é o árbitro da necessidade ou não dos cortes. Os tribunais encaminham a proposta orçamentária nos termos da Constituição e ela precisa ser incorporada na íntegra, intacta, sem cortes, pelo Executivo", afirmou o ministro em entrevista ao jornal O Globo.
Nesse embate entre os Poderes por razões orçamentárias, a razão pende para o Executivo. Ao consagrar o princípio da tripartição dos Poderes, a Constituição é taxativa ao afirmar que eles são "independentes e harmônicos". Ou seja, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário gozam de autonomia financeira e administrativa, mas o cofre é um só e a responsabilidade sobre o que entra e, principalmente, sobre o que sai é do Executivo. Ele é que controla o Tesouro Nacional. E também cabe a ele a responsabilidade pela realização do Orçamento, depois de ouvidos os demais Poderes.
Evidentemente, os tribunais têm o direito de reivindicar aumento de verbas e de apresentar pedidos de recursos para gastos extras. Mas a preparação do Orçamento é de prerrogativa do Executivo - e é a proposta por ele formulada que o Congresso tem de aprovar, emendar ou rejeitar. É esse detalhe que o Judiciário - o Poder que paga os salários mais altos do funcionalismo público - se recusa a reconhecer.