PAULO SANT’ANA
Importante cartaRecebo de um cobrador de ônibus da Carris, que está em greve, um interessante e-mail em que faz defesa das acusações que esta coluna tem feito contra os grevistas. Está assinado. Ei-lo:
“Amigo Pablo, sou fiel leitor de sua coluna, daqueles que leem ZH de trás pra frente. Talvez eu passe das 10 linhas, mas gostaria que o amigo lesse até o final. Em janeiro de 1999, entrei na Carris através de concurso público, assumindo a função de cobrador de ônibus, naquela época, eu bem lembro, tinha assinatura da revista Veja, ZH completa e Correio do Povo, além de um plano de saúde particular, sem falar nos seguros de vida e de morte etc. e tal. Passados uns dois ou três anos, tive que cancelar todo esse aparato, com exceção de ZH, que na época me ofertaram a light, da qual sou assinante até hoje. Como o senhor percebeu, pois é uma pessoa inteligente, o meu salário misteriosamente não estava suprindo minhas necessidades intelectuais. Passaram-se os anos e as coisas só pioraram.
Nós, rodoviários gaúchos, acordamos, unidos, derrubamos um presidente corrupto e ladrão do nosso sindicato. Pior, ele é político influente na cidade de Alvorada. O senhor, sendo uma pessoa bem informada, sabe que nosso salário, dos rodoviários, vem diminuindo de uma maneira assustadora. O nosso estresse no trânsito complicado de POA e a falta de educação das pessoas estão nos deixando à beira da morte. Pergunte para sua colega Cristina Ranzolin, pois ela viveu a experiência de se passar por cobradora e, pelo que sabemos, não foi nada agradável. Sugiro que o senhor use um disfarce e faça uma tabela completa, tendo três horas de intervalo. Tenho certeza de que o senhor irá mudar de opinião em relação a nós. Não é à toa que muitos de nós fazem concurso para trabalhar na EPTC. Lá, sim, existe qualidade de vida, seis horas corridas e mais um monte de vantagens, informe-se.
Agora, eu peço desculpa, mas tenho que lhe falar: é muito fácil, e até patético, estar sentado numa sala confortável com ar condicionado e com toda a qualidade de vida possível dentro de seu trabalho, e ficar criticando e metendo o pau em nossa categoria. O senhor está nos ofendendo, pois nós também somos parte da sociedade, também estamos pagando o preço pela greve. Vou dar-lhe um exemplo de hoje: tinha uma consulta médica agendada há uns 20 dias no centro de POA, eu tinha que ir e fui. Peguei o carro emprestado de minha mãe, gastei R$ 17 de estacionamento e R$ 20 de gasolina, acha que fiquei feliz??? Claro que não. Como eu sou parte dessa sociedade, eu também pago pela greve. Meus colegas que não têm carro e dinheiro para se deslocar até as garagens para montar os piquetes também pagam pela greve.
Agora, uma pessoa intelectual como o senhor, vir dizer que fizemos essa greve nesta época para veranear, beira o absurdo. O senhor tinha que ser mais responsável, amigo. Se informe melhor, não se deixe iludir. Nós somos gaúchos, temos de mudar o que está errado, é justo os empresários do transporte público enriquecerem de uma maneira que nos torna escravos deles? Amigo, tem dono de empresa que tem frota de táxi, de lotação, de empresa de turismo e até de aviões particulares, ou o senhor não sabe disso? Mete o pau neles, não em nós. O que está errado é o sistema. O senhor consegue mudá-lo? Nós estamos tentando. Por favor, nos ajude e não nos atrapalhe. Não esqueça, nós somos modelo desta terra. Procure o Alceu Weber, líder do MIR – Movimento Independente dos Rodoviários, tenho certeza de que o senhor irá mudar de opinião. Abraço. Sou cobrador de ônibus e tradicionalista, meu nome é João Carlos Vargas do Nascimento e meu e-mail é
[email protected]”.