Justiça
ATENTATO À JUSTIÇA - A INÉRCIA DE UM PAÍS
No espaço de opinião, O Estado de S.Paulo referenciou na sua edição de 17/08/2011 a execução a tiros da magistrada fluminense Patrícia Acioli, titular da 4.ª Vara Criminal de São Gonçalo, como sendo o terceiro assassinato de juízes brasileiros ocorridos neste início do século 21 e em 2003.
"No primeiro, a vítima foi o corregedor dos presídios de Presidente Prudente, Antonio José Machado Dias, que tinha a responsabilidade de julgar os pedidos de liberação e transferência de presos da penitenciária de segurança máxima de Presidente Bernardes, onde a cúpula do PCC cumpria pena. No segundo, a vítima foi o juiz Alexandre Martins de Castro Filho, da 5.ª Vara de Execuções de Vitória, que integrava uma força-tarefa que investigava a ligação de políticos - inclusive dois ex-governadores - com o crime organizado." Neles, o crime organizado usava da sua "mão de ferro" para intimidar aqueles aqueles que ousam enfrentar ou prejudicar seus negócios, suas alianças e a boa vida dos chefões. "A estratégia intimidativa não é nova e tem sido utilizada pelo narcotráfico no México, na Colômbia e na Bolívia, depois de ter sido empregada durante décadas pela máfia italiana, que, em 1992, matou os juízes Giovani Falcone e Paolo Borselino", descreve muito bem o jornal.
Na Itália, houve uma reação firme com apoio solidário e atuante da sociedade que se mobilizou em abaixo-assinados, pressionou políticos para adoção de leis rigorosas e condutas probas, e aplaudiu a decisão dos magistrados e dos promotores públicos, auxiliados pelas forças policiais, em atacar de frente, publicamente e de forma incansável o crime organizado. A Operação Mãos Limpas sacrificou vidas, mas deu um basta à impunidade e a liberdade de ação das máfias naquele país. Os Estados Unidos, após viverem décadas de terror nos anos 20 e 30 com a ação de gangues e posteriormente com redes mafiosas em solo americano, também reagiu com leis rigorosas e mudança de comportamento da sociedade que estabeleceu como preferência um perfil político e parlamentar comprometido com a ordem pública.
Infelizmente por aqui, a reação não é a mesma. As respostas não passam da retórica e de rompantes de uma solidariedade imaginária por parte dos magistrados, promotores, políticos e sociedade. Todos esperam passar a repercussão para continuar adotando a mesma postura omissa, adormecida, conivente e desinteressada com as questões de justiça e ordem pública.
No Brasil, juízes, promotores e policiais que tentam combater o crime com medidas enérgicas, exercem suas funções sem salvaguardas das leis, pois são tantas os privilégios, as benevolências, as penas brandas, a morosidade dos processos, a corrupção, o descaso político, as omissões nos parlamentos, as negligências do Executivo e as amarras, o sucateamento, o fracionamento das atividades e a desvalorização das forças policiais que seus esforços coativos ficam inutilizados, desmoralizados e insuficientes para garantir direitos e a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. A polícia se esmera sacrificando tempo e vidas dos policiais para prender os criminosos para a justiça soltar por falta de vagas nos presídios ou por força de leis anti-cidadão que fomentam o terror, a insegurança e a morte de inocentes.
Na minha opinião, para reagir, precisamos de três "revoluções" urgentes: comportamental, organizacional e processual. Só estas poderão levantar a sociedade e os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário contra o crime.
Na área comportamental, precisamos reconhecer que o Brasil convive com um ambiente de: desordem social, insegurança jurídica, desordem judiciária, omissão política e desordem pública. Assim, podemos a sociedade pode exigir ação dos Poderes para que deixem de ser manipulados pelos interesses mafiosos, deixem de colocar interesses pessoais e corporativos na frente da supremacia do interesse público, e deixem de se lixar para a paz social e para a opinião pública.
Na área organizacional, são necessárias reformas profundas nas organizações policiais saneando os quadros, estabelecendo o ciclo completo, valorizando a profissão mais estressante e insegura do planeta, e promovendo ligações essenciais, aproximadas e auxiliares com a justiça e promotorias públicas.
Na área processual, o Poder Judiciário precisa se reestruturar. A invés de focar apenas em salários, o poder precisa aproximar a justiça do cidadão e das comunidade através da criação de varas judiciais em todos os municípios do Brasil. É necessário fortalecer os juizes naturais e os Tribunais Regionais concedendo a estes o transitado em julgado da maioria dos litígios, deixando para as Cortes Supremas apenas casos de relevância federal e internacional (onde estão as tais súmulas vinculantes?). Outras medidas pertinentes são: aumentar o número de juízes e servidores da justiça; criar a Polícia Judiciária (ou, melhor, passar a polícia civil para o Poder Judiciário); substituir a peça acessória do inquérito policial por relatório anexando oitivas gravadas em vídeo e provas periciais; reduzir as instâncias de recursos; diminuir os prazos processuais; minimizar a burocracia dos papéis e ligações; e priorizar a função precípua que é a aplicação coativa das leis.
Palavras não vencem batalhas diante de uma quadro onde "bandidos cumprem as ameaças", "as autoridades não cumprem as promessas de lhes dar o devido combate" e a sociedade não consegue se mobilizar para promover as mudanças. Há uma amnésia geral que faz esquecer as promessas por segurança, saúde e educação gravadas em vídeos e áudios das campanhas dos candidatos. Há uma conivência geral destes políticos que, depois de eleitos, passam a chamar os bandidos de "coitadinhos" e "produtos" de um Estado negligente no social e uma sociedade não solidária. Quando a crise aumenta, sobem à tribuna e aparecem nos veículos de comunicação com soluções que navegam de mão em mão até desaparecer no "triângulo das bermudas" do congresso. Estas soluções reaparecem numa nova campanha eleitoral...e elegem seus profetas.
Estas afrontas do crime organizado nada mais são do que fruto de um Estado que governa voltado para apenas para os interesses políticos, amaciado pela magistratura e mantido por uma nação em estado de inércia, onde são criadas, aprovadas e aplicadas leis anacrônicas, inócuas e com fundo terapêutico e tolerante, cujos resultados são enfraquecimento da autoridade, penas brandas, benevolências, impunidade, criminalidade, violência, crueldade e torturas dentro das cadeias, nas ruas e nos lares, além de promover a ousadia do poder paralelo em agir contra o Estado.
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