A REFORMA DOS CÓDIGOS
Justiça

A REFORMA DOS CÓDIGOS



O Estado de S.Paulo, 05 de fevereiro de 2013 | 2h 08


OPINIÃO 


Preocupada com os problemas que estão surgindo com a reforma do Código Penal e do Código de Processo Penal, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) tomou duas importantes iniciativas. Primeiro, advertiu o Congresso para a má qualidade dos dispositivos relativos aos crimes financeiros, alegando que a tipificação desse tipo de delito é confusa e que as penas previstas são muito mais brandas do que as que estão em vigor e, segundo, prometeu enviar uma nota técnica ao Senado, dentro de dois meses, com sugestões para aperfeiçoar os projetos que lá estão sendo discutidos.



Os dois códigos estão em vigor desde 1940 e 1941, respectivamente. Apesar de considerar sua reforma necessária e oportuna, os juízes criminais federais discordam do modo como vem sendo conduzida. Instalada em outubro de 2011, a comissão especial do Senado encarregada de preparar a reforma do sistema criminal do País elaborou um projeto de Código Penal que foi muito mal recebido por magistrados, procuradores de Justiça e criminalistas. Em audiência pública realizada no ano passado no Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), a entidade alegou que a comissão cedeu a interesses políticos, grupos de pressão e corporações profissionais. Na ocasião, juristas respeitados classificam o projeto como "obsceno".

Segundo eles, a proposta contém incoerências e deixa a desejar em muitos pontos, incorporando modismos doutrinários e inovações que não têm apoio entre os especialistas em direito penal. No caso dos crimes financeiros, por exemplo, o projeto deixa de listar, como delito, o funcionamento de instituição financeira não autorizada e a adoção de contabilidade paralela pelos bancos. Além disso, limita o conceito jurídico de evasão de divisas apenas à saída física do dinheiro. Isso significa que um doleiro que fizer uma remessa por meios eletrônicos ficaria livre de punição.

Os juízes federais consideram ainda que a comissão do Senado cedeu às pressões da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), introduzindo no projeto um artigo que criminaliza eventuais violações das prerrogativas dos advogados. Além de alegar que seus filiados não são subordinados hierarquicamente aos juízes, a entidade acusa a magistratura de "calar" e "humilhar" os advogados. Os juízes federais consideram as pretensões da OAB exageradas e afirmam que a proposta da entidade acolhida pela comissão viola a independência do juiz. "A criminalização das violações das prerrogativas dos advogados gera temor e insegurança. Se o magistrado indefere o pedido de um advogado, não é o caso de se imputar um crime, mas apenas de impetrar um recurso judicial", afirma o juiz federal Rafael Wolff.

Entre as sugestões que a Ajufe apresentará à comissão de reforma do Código Penal e do Código de Processo Penal, duas merecem destaques: alterar os critérios de contagem do prazo de prescrição e ampliar o sistema de delação premiada. Inspirando-se no plea bargain vigente na legislação processual penal dos Estados Unidos, os juízes federais defendem a adoção de um mecanismo processual pelo qual o acusado pode fazer um acordo para confessar o crime, em troca da redução da pena.

No sistema da delação premiada, para reduzir a pena um dos acusados contribui com informações sobre terceiros envolvidos no crime. Já no sistema da plea bargain, o acordo abrange apenas o réu e o crime por ele praticado - e a negociação tem de ser feita tanto com o juiz como com o Ministério Público. Segundo Sérgio Moro, 85% dos casos criminais na Justiça Federal dos Estados Unidos terminam em acordo. "Esse sistema possibilita a resolução de casos singelos de forma mais rápida, permitindo ao Judiciário concentrar o foco nos casos mais complexos".

Algumas das propostas da Ajufe já estão contempladas no projeto elaborado pela comissão do Senado. Para a entidade, contudo, a reforma do Código Penal e do Código de Processo Penal será demorada, mas projetos específicos sobre aumento do prazo de prescrição de crimes e a introdução do plea bargain poderiam ser aprovados mais rapidamente.



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