Justiça
A JUSTIÇA DESAFIADA
EDITORIAL ZERO HORA 31/08/2011
A Justiça brasileira está sendo confrontada mais uma vez com suas próprias deficiên cias, mas demonstra, ao mesmo tempo, um poder de reação elogiável. As limitações foram expostas pelo estudo Justiça em Números, que aponta fundamentalmente para a morosidade.
O dado básico da pesquisa é preocupante: de cada cem processos que tramitaram no Judiciário em 2010, apenas 30 chegaram ao final do ano com uma solução. É essa a medida do que os magistrados definem como congestionamento, ou acúmulo de processos, provocado por um conjunto de fatores, nem todos sob controle de juízes, desembargadores e ministros das altas cortes. O aspecto positivo é o que revela, logo depois da divulgação da pesquisa pelo Conselho Nacional de Justiça, a capacidade de enfrentamento das limitações, com um amplo debate sobre as questões apontadas, como ocorreu em seminário do CNJ na última segunda-feira em Brasília.
É uma virtude a ser reconhecida, como observou a ministra Ellen Gracie Northfleet, em entrevista para a revista Veja desta semana. Primeira mulher a chegar ao Supremo, do qual se despede depois de 11 anos, a ministra aponta a evolução da Justiça no Brasil, sem ignorar suas deficiências. Não são poucas. A própria ministra admite que “o maior problema do Judiciário é a lerdeza” e lembra que isso não decorre apenas da falta de juízes, mas também de problemas de gestão. Ao acúmulo de processos na primeira instância e nos tribunais regionais, agrega-se ainda a enxurrada de recursos à mais alta corte do país, provocada por brechas legais, das quais os advogados passaram a tirar proveito para procrastinar decisões e, não raras vezes, evitar condenações pela prescrição de crimes.
Esse mesmo Judiciário enfrenta, como questão controversa, o chamado ativismo judicial, que se manifesta especialmente no Supremo, cuja atribuição é a de deslindar conflitos à luz da Constituição. Foi por conta desse ativismo que o STF chegou a ser acusado de tentar substituir os legisladores quando tomou decisões nos complexos casos da liberação das pesquisas com células-tronco embrionárias e do reconhecimento da união homoafetiva. Sabe-se, pela manifestação dos integrantes do Supremo, reforçada na entrevista da senhora Ellen Gracie, que o STF apenas atuou quando provocado pela sociedade, sem a pretensão de legislar, mas, sim, de acolher demandas recusadas pela incapacidade do Congresso de se posicionar diante de temas que considera delicados.
Que se reconheça igualmente a modernização dos procedimentos da Justiça, a preocupação com a transparência – que permite a transmissão das sessões do Supremo pela TV, caso raro no mundo – e a melhoria da gestão administrativa. Mas falta muito para que o Judiciário, que deve preservar sua autonomia em relação a quaisquer formas de interferência político-partidária ou ideológica, contemple os cidadãos com a presteza do poder que zela por direitos individuais e coletivos. Há um déficit a ser corrigido, e as soluções apontadas no seminário realizado em Brasília passam também pela manifestação do brasileiro comum que recorre ao Judiciário em suas comunidades. Só assim, quando ouvir os dilemas do cidadão que procura a primeira instância, o diagnóstico da Justiça em Números estará completo.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O que preocupa é que este "dado básico da pesquisa" é o mesmo de tantas outras pesquisas realizadas no âmbito da sociedade e do judiciário, amplamente discutido, debatido e prometida soluções, mas estas soluções ficam restritas à oratória dos magistrados. O mundo toda sabe que a justiça do Brasil é morosa e que aqui impera a impunidade, as benevolências, a tolerância, as divergências, o centralismo e a insegurança jurídica. É só atentar para as pesquidas da Associação dos Magistrados do Brasil e lá terão todos os dados indicadores das mazelas que impedem a eficácia da justiça no Brasil e o cumprimento de sua função precípua que é a APLICAÇÃO COATIVA DAS LEIS.
É "preocupante" que todos saibam destes óbices e mesmo assim as medidas tem sido superficiais, imediatistas e pontuais, aplaudindo soluções óbvias que em nada mudam o cenário caótico e desacreditado da justiça brasileira.
Os únicos aspectos positivos são o reconhecimento de alguns magistrados como o atual Ministro César Pelusso do caos instalado, bem como o esforço do CNJ em mudar posturas, comportamentos, estrutura judicial e leis que possam fortalecer a ação dos juízes e impor a autoridade judicial num país onde os congressistas se lixam para seus eleitores, para a constituição, para a justiça e para as leis.
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