Justiça
A CORREGEDORA VOLTA À CARGA
O Estado de S.Paulo - 02/03/2012Em audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, a corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, fez três afirmações dignas de nota. Primeiro, ela voltou a dizer que uma minoria de juízes relapsos e corruptos não pode macular a imagem de uma corporação integrada por cerca de 15 mil magistrados.
"Juízes decentes não podem ser confundidos com meia dúzia de vagabundos infiltrados na magistratura", disse ela. Seu depoimento ocorreu no mesmo dia em que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou o afastamento de mais um magistrado acusado de desvio de conduta. Trata-se de um juiz estadual que atuava na comarca de Picos, no Piauí, e que foi punido por negociar sentenças, vender liminares e ter feito saques irregulares no valor de R$ 1 milhão.
Em seguida, a ministra Eliana Calmon defendeu a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) n.º 97, de autoria do senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Além de ampliar as prerrogativas da Corregedoria Nacional de Justiça para investigar e processar juízes acusados de irregularidades, a PEC reafirma, sem deixar margem a dúvidas, a autonomia funcional e administrativa do CNJ. Essas medidas foram propostas para evitar que o STF, ao julgar as ações de inconstitucionalidade interpostas por associações de juízes contra o órgão de controle da magistratura, acabe retirando funções do CNJ e esvaziando sua corregedoria.
Entre 2005 - quando começou a funcionar - e 2011, o CNJ foi objeto de vinte ações diretas de inconstitucionalidade movidas pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), pela Associação de Juízes Federais (Ajufe) e pela Associação Nacional de Desembargadores (Andes). Graças ao apoio da opinião pública, o CNJ conseguiu derrubar as duas liminares que o impediam de investigar as Justiças estaduais. Uma delas, concedida pelo ministro Ricardo Lewandowski, referia-se à investigação, pela Corregedoria Nacional de Justiça, de pagamentos considerados irregulares feitos a desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo. A AMB, dirigida por um dos magistrados da Corte, acusou Eliana Calmon de ter quebrado o sigilo bancário e o fiscal de magistrados estaduais.
Em seu depoimento no Senado, a ministra voltou a criticar as corregedorias das Justiças estaduais, alegando que elas não fiscalizam os desembargadores. "Os magistrados de segundo grau são os mais deletérios quando enveredam para o mal. É dificílimo um tribunal julgar um desembargador. Se ele tem a simpatia do colegiado - e os malandros são extremamente simpáticos -, o tribunal não julga. Não tenho medo dos maus juízes, mas do silêncio dos bons juízes, que se calam na hora do julgamento", disse ela, depois de afirmar que a Justiça está vivendo uma "crise ética".
O terceiro ponto relevante levantado pela corregedora nacional de Justiça, em seu depoimento, foram os créditos trabalhistas da magistratura. A ministra Eliana Calmon diz que eles decorrem de vantagens funcionais concebidas para contornar o teto salarial do setor público. E também denunciou a troca de favores entre presidentes de Tribunais de Justiça e governadores. "É um descalabro. Toda vez que um governador corrupto quer um favor ele se junta ao presidente do tribunal e dá aumento. Os desembargadores ganham o teto de R$ 26 mil, mas em três meses vem um penduricalho, uma gratificação monstruosa. Se dividir tudo por 12 meses, eles ganham R$ 40 mil, R$ 50 mil, R$ 70 mil. E os Estados mais pobres são aqueles que pagam mais", disse ela.
Feito o diagnóstico dos descalabros que denigrem a imagem da magistratura, o presidente da AMB, desembargador Nelson Calandra, observou, em tom irônico, que a ministra Eliana Calmon não é boa comunicadora. "De vez em quando sai alguma coisa fora do tom. Essa é mais uma." Diante da importância do que disse a corregedora nacional de Justiça, custa crer que essa tenha sido a resposta do representante daqueles que se sentiram por ela criticados.
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