ZERO HORA 16 de novembro de 2013 | N° 17616
ANTIGA CÚPULA DO PT VAI PARA A PRISÃO
Oito anos depois de vir à tona o mensalão e cerca de um ano após o Supremo Tribunal Federal (STF) condenar 25 pessoas por envolvimento no escândalo, ontem, em pleno feriado de Proclamação da República, foi decretada a execução imediata da pena de 12 réus. Entre os que tiveram mandado de prisão, estavam três integrantes da antiga cúpula do PT durante o primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva: José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares.
Até as 22h45min, 10 condenados já haviam se entregado à Polícia Federal. O primeiro foi Genoino, ex-presidente do PT condenado a seis anos e 11 meses de prisão em regime semiaberto. O petista entrou na superintendência da PF em São Paulo pela porta da frente, acompanhado da mulher, Rioco Kayano, e do advogado. Amigos e militantes do PT estavam em frente ao prédio e gritaram mensagem de apoio: “Viva Genoino”. Já na superintendência, Genoino também gritou: “Viva o PT”.
Ainda em casa, o ex-presidente do PT havia consolado a filha mais velha, Miruna, que estava chorando:
– Fui em cana, cela fechada, sem banho de sol, torturado e estou aqui, de novo com o espírito dos anos 70.
Aos amigos, também em casa, comparou essa ocasião à de outra prisão:
– Na ditadura, em cinco anos eu fui preso, torturado, julgado, condenado e cumpri a pena. Agora, estou há oito anos esperando.
O ex-ministro José Dirceu, denunciado como chefe do esquema, chegou à PF de São Paulo por volta das 20h30min. Condenado a 10 anos e 10 meses de prisão, ele repetiu o mesmo gesto de Genoino, levantando o braço para o grupo de apoiadores que se encontrava em frente à superintendência.
Sete dos 12 condenados com prisão decretada ontem pelo presidente do STF, Joaquim Barbosa, são de Minas Gerais. É no Estado onde atuava o chamado núcleo operacional do esquema, sob o comando do publicitário Marcos Valério. O primeiro a se apresentar à PF em Minas foi Cristiano Paz (ex-sócio-presidente das empresas SMP&B e Graffiti). Na sequência, se apresentaram Simone Vasconcelos (ex-diretora da SMP&B), o ex-deputado Romeu Queiroz (PTB), Kátia Rabello (ex-presidente do Banco Rural), Ramon Hollerbach (ex-sócio de Marcos Valério) e Marcos Valério (considerado o operador do esquema). José Roberto Salgado (ex-diretor do Banco Rural) se apresentou por volta das 22h30min. Na superintendência da PF no Distrito Federal havia se entregado, à noite, o ex-tesoureiro do extinto PL Jacinto Lamas.
Dos dois presos restantes, Delúbio garantiu por meio de seu advogado que se apresentará na manhã de hoje e Henrique Pizzolato (ex-diretor do Banco do Brasil) não havia sido localizado até as 22h45min. Devido a uma decisão do STF, o juiz de execuções penais de Brasília será responsável por executar as penas. Quando os condenados forem entregues, o juiz deverá enviar ao presídio da Papuda os presos que ficarão em regime inicialmente fechado, como Marcos Valério.
Aqueles que forem enviados para o regime semiaberto, como Dirceu, Genoino e Delúbio, ficarão no Centro de Progressão Penitenciária (CPP), situado a cerca de 15 minutos do centro de Brasília. Os presos enviados ao CPP, entretanto, terão de receber uma autorização da Justiça antes de poderem sair do estabelecimento prisional durante o dia para trabalhar.
Todos deverão pedir à Justiça para serem transferidos a seus Estados de origem, o que sugere um trâmite demorado até eles, de fato, poderem apenas dormir na cadeia.
Dirceu se diz vítima de julgamento políticoAntes de se apresentar à Superintendência da Polícia Federal em São Paulo, o ex-ministro José Dirceu divulgou em seu site um texto intitulado Carta ao povo brasileiro. Na mensagem, o homem apontado como chefe do esquema de compra de votos no Congresso durante o governo Lula afirmou que o Supremo Tribunal Federal (STF) ignorou “provas categóricas” e garantiu que permanecerá lutando para provar a inocência.
Dirceu frisou que o julgamento do mensalão “caminha para o fim como começou: inovando – e violando – garantias individuais asseguradas pela Constituição e pela Convenção Americana dos Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário”.
Para o petista, a análise dos ministros do Supremo é feita “sob o signo da exceção e assim permanece”. Dirceu criticou o fato de o processo não ter sido desmembrado para primeira instância, apontando que foi violado o direito ao duplo grau de jurisdição. “Ficamos nós, os réus, com um suposto foro privilegiado, direito que eu não tinha, o que fez do caso um julgamento de exceção e político”.
Apesar do discurso em tom de ataque, o petista garantiu que cumprirá o que prevê a Constituição, mas não o fará “sem protestar e denunciar o caráter injusto da condenação”. E sentenciou: “a pior das injustiças é aquela cometida pela própria Justiça”.
Mais adiante, Dirceu reclama ter sido condenado sem provas e reitera que está sendo punido pelo crime de formação de quadrilha contra o qual ainda cabe recurso. “Fui condenado sem ato de ofício ou provas, num julgamento transmitido dia e noite pela TV, sob pressão da grande imprensa, que durante esses oito anos me submeteu a um pré-julgamento e linchamento”.
Em tom de desabafo, Dirceu disse que não foi condenado por seus quase 50 anos de vida política “dedicada integralmente ao Brasil, à democracia e ao povo brasileiro”. Frisou que nunca foi investigado em sua vida pública e destacou que sua condenação é uma “tentativa de julgar nossa luta e nossa história, da esquerda e do PT, nossos governos e nosso projeto político”.
Também lembrou sua prisão durante o regime militar: “Fui preso político durante a ditadura militar. Serei preso político de uma democracia sob pressão das elites”. Por fim, reiterou que permanecerá lutando para provar sua inocência e anular “esta sentença espúria”, por meio de revisão criminal e apelo às cortes internacionais. “Peço aos amigos e companheiros que mantenham a serenidade e a firmeza”, concluiu.
O ex-presidente Lula telefonou para Dirceu e Genoino logo após saber da expedição dos mandados.
– Estamos juntos – disse Lula, aos companheiros.
Ao deixar o Planalto, o petista prometeu “desmontar a farsa do mensalão”.
Para PT, houve “casuísmo”
O presidente nacional do PT, deputado estadual Rui Falcão (SP), divulgou nota oficial na qual considera que a determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) para a execução imediata das penas de petistas condenados no mensalão “antes mesmo que seus recursos (embargos infringentes) tenham sido julgados, constitui casuísmo jurídico e fere o princípio da ampla defesa”.
Falcão diz, no documento, expressar a solidariedade “aos companheiros injustiçados” e conclama a “militância a mobilizar-se contra as tentativas de criminalização do PT”.
Entre os petistas que tiveram a ordem de prisão expedida, estão o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro Delúbio Soares e o deputado José Genoino (SP). “Embora caiba aos companheiros acatar a decisão, o PT reafirma a posição anteriormente manifestada em nota da Comissão Executiva Nacional, em novembro de 2012, que considerou o julgamento injusto, nitidamente político, e alheio a provas dos autos”, informou.
Falcão ressalta ainda que, “com a mesma postura equilibrada e serena do momento do início do julgamento”, o partido reitera a “convicção de que nenhum de nossos filiados comprou votos no Congresso, nem tampouco houve pagamento de mesada a parlamentares”. “Reafirmamos, também, que não houve da parte dos petistas condenados, utilização de recursos públicos, nem apropriação privada e pessoal para enriquecimento”, concluiu.
Em artigo publicado no site Brasil 247, pouco antes de ter sua prisão decretada, Delúbio exaltou o PT e não citou diretamente o episódio do mensalão. “Nada fará retroceder a legenda que em pouco mais de três décadas de existência sacudiu as estruturas de um Brasil destroçado pelas três sucessivas quebras no governo neoliberal de FH”.
Sem citar a sua condenação de oito anos e 11 meses de prisão mais o pagamento de multa de R$ 325 mil, Delúbio fala em perseguições e elogia o PT. “Nosso compromisso com os brasileiros é tamanho e nossa fé nos ideais que professamos é de tal forma grandiosa, que os imensos sacrifícios pessoais, os ódios que atraímos e as perseguições covardes das quais somos vítimas nada representam diante da responsabilidade que os brasileiros nos depositam, de forma crescente a cada eleição, fazendo do PT o mais querido, admirado e respeitado partido da história do Brasil”, escreveu.
O senador José Agripino, presidente nacional do DEM, também se manifestou a respeito das prisões. “Em muito boa hora o Supremo se reúne e recupera a confiança do país na sua justiça”, escreveu. “A decisão do STF deixa claro que a organização criminosa existiu, praticou o dolo e por isso foi punida exemplarmente”.
Na opinião de Agripino, o Brasil viverá um novo momento a partir de agora. “Não é apenas a figura política de Dirceu que está indo para a cadeia, mas uma quadrilha de pessoas poderosas”.
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