PF X GOVERNO - AUTONOMIA E CONTROLE É FONTE DE TENSÃO
Justiça

PF X GOVERNO - AUTONOMIA E CONTROLE É FONTE DE TENSÃO



Análise: Relação entre autonomia e controle é fonte de tensão na PF
- ROGÉRIO BASTOS ARANTES, ESPECIAL PARA A FOLHA. ROGÉRIO BASTOS ARANTES é professor doutor do Departamento de Ciência Política da USP. FOLHA.COM, 13/08/2011 - 08h17

A Operação Voucher não deveria causar surpresa, afinal já assistimos a mais de 1400 operações desde junho de 2003, quando a Polícia Federal passou a batizar em série suas ações de combate ao crime organizado e à corrupção.

Foram quase 14 por mês ou uma a cada dois dias desde então. A Voucher é a 1414.

Essas operações representam um ponto de inflexão no combate à corrupção no Brasil. Elas têm sido capazes de revelar os mecanismos básicos de financiamento da classe política brasileira ou, se preferirem, o financiamento político de uma classe de pessoas dispostas a corromper o Estado e apropriar-se do dinheiro público.

Enquanto essa questão não for enfrentada, em todas as suas dimensões, a PF terá que seguir exercitando sua veia literária, dando novos nomes a operações de mesmo conteúdo.

Sempre que operações da PF atingem a classe política, há quem contra-ataque afirmando que os federais estariam abusando do poder de polícia. Essa crítica tem duas variantes, contraditórias entre si: uns dizem que a PF estaria fora de controle e outros especulam que ela estaria agindo de modo politicamente orientado. No primeiro caso, seria excesso de autonomia. No segundo, submissão a controle político.

Pode-se dizer que a relação entre autonomia e controle é fonte permanente de tensão na vida de muitas instituições, do Ministério Público ao Banco Central, passando agora pela Polícia.

O que não tem sido devidamente observado é que a maioria das operações ocorre por meio de um consórcio de instituições. Embora a fase policial seja a de maior visibilidade, a execução de mandados de prisão ou de busca e apreensão só ocorre por autorização de um Juiz, após período de investigação que pode durar semanas ou meses e que quase sempre conta com a participação ativa do Ministério Público e de outros órgãos de fiscalização.

É difícil, portanto, sustentar as hipóteses de controle político ou de excesso de autonomia deste ou daquele quando está em funcionamento um sistema de freios e contrapesos.

Não há como resolver esse tipo de dilema institucional de modo definitivo. No caso da PF, o equilíbrio dependerá da percepção de seus próprios membros sobre a relação existente entre a sua atuação presente e sua projeção futura: o exercício de sua missão institucional, a obediência aos limites constitucionais e a resistência às hipóteses de abuso de poder ou de sujeição política são condições necessárias à afirmação, no longo prazo, de sua própria independência institucional.


Dilma chama de 'acinte' ação da PF e questiona uso de algemas - FOLHA.COM, 11/08/2011 - 09h41

A presidente Dilma Rousseff ficou "furiosa" ao ver, logo na manhã de ontem, foto de um dos detidos chegando algemado a Brasília, informa reportagem de Natuza Nery e Valdo Cruz publicada.

Tratava-se do secretário-executivo do Ministério do Turismo, Frederico Silva da Costa, suspeito de integrar o esquema de desvios de verba no Ministério do Turismo.

Ela chamou de "acinte" a forma como a PF conduziu a ação policial. A interlocutores disse ter visto excessos e, por isso, deu ordem ao ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) para responder de forma enérgica.

O ministro cobrou explicações em "caráter de urgência" e afirmou que, "caso constatada qualquer infração às regras em vigor, determino a abertura imediata dos procedimentos disciplinares cabíveis".

De acordo com a súmula vinculante nº 11 do STF (Supremo Tribunal Federal), publicada em 2008, o uso de algemas só é permitido quando os presos oferecem resistência ou existe a possibilidade de fuga, além de risco aos policiais.

A súmula obriga a PF a justificar por escrito porque usou algema. "Só é lícito em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito", diz a regra.

O documento prevê ainda que o uso irregular pode ter como pena a responsabilização penal do policial que usou a algema, além da anulação da prisão. O ministro do STF Marco Aurélio Mello criticou na terça-feira o uso de algemas na Operação Voucher.

Líderes da base aliada na Câmara também reclamaram de abuso de poder do Judiciário no caso das prisões no Ministério do Turismo.

Para o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), uma pessoa que está há dois meses no ministério, como Colbert Martins, não pode ser presa sem nenhum tipo de explicação por convênios firmados em 2009.

"Acho que houve abuso de poder do Judiciário e do Ministério Público", afirmou o petista na terça-feira.

A opinião é a mesma do líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), que reclamou do tratamento dado pelo Judiciário ao seu correligionário, Colbert Martins. "Isso é um absurdo. Ele foi preso sem nem saber o porquê, sem nem ter sido ouvido. Esse procedimento não é correto, não faz parte do Estado democrático de direito", disse.

VOUCHER

A Polícia Federal deflagrou a Operação Voucher com o objetivo de investigar desvio de dinheiro num convênio de R$ 4,45 milhões firmado entre o Ministério do Turismo e o Ibrasi (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento de Infraestrutura Sustentável), foco da fraude. No total, 36 pessoas foram presas.

Na ação, com cerca de 200 policiais federais, divididos em São Paulo, Brasília e Macapá, a PF cumpriu 19 mandados de prisão preventiva e 19 mandados de prisão temporária --também foram expedidos sete mandados de busca e apreensão.




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