O QUE É ROLEZINHO?
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O QUE É ROLEZINHO?


REDE GLOBO FANTÁSTICO, Edição do dia 19/01/2014

19/01/2014 22h40 - Atualizado em 19/01/2014 22h41

'A gente está aqui para se conhecer, tirar fotos', diz menina sobre rolezinho

Juan, Yasmin e Renatinho são 'famosinhos' da internet e convidam seus fãs para encontros nos shoppings de São Paulo.





Neste domingo (19) eram esperados novos rolezinhos pelo país, mas eles não aconteceram.

Em Porto Alegre, cerca de 15 jovens circularam pelos corredores de um shopping cantando e dançando funk e depois foram embora.

No Rio de Janeiro, onde dois shoppings da Zona Sul ficaram fechados por causa de uma manifestação em apoio aos rolezinhos, houve um protesto também ao som de música funk.

Mas afinal o que é rolezinho? Como essa história começou?

Eles pegaram todo mundo de surpresa. E também não imaginavam que algo assim poderia acontecer. Era para ser só um encontro, mas ficou tão grande que gerou tumulto, medo, repressão e muita discussão.

Eles estão de férias. Juan faz a sobrancelha toda semana. Os passos de Yasmin são acompanhados todos os dias por 84 mil pessoas. Renatinho não sabe ainda se quer ser cientista ou MC. Você não conhece nenhum deles. Mas eles são famosos. Ou, como eles dizem, famosinhos.

Fantástico: Você tem quantos seguidores na internet?
Juan: 56 mil fãs agora.
Fantástico: Você ganha presentes das suas fãs?
Juan: Ganho.
Fantástico: Que tipo de presente?
Juan: Dão coração. Mais esse outro coração.

Juan começou a postar vídeos que fez dele mesmo dançando no quarto. E daí começou a ser seguido na internet por muita gente.

“Agora, eu quero começar como MC”, ele conta.

Yasmin não canta, tem vergonha de dançar. Mas seu perfil na internet é um sucesso.

“Eu tenho 84 mil seguidores, 4 mil e quinhentos e alguma coisa amigos. Vou adicionando porque é bom ter bastante amigos”, ela diz.

Ela não sabe explicar exatamente o motivo de ser tão conhecida. Mas pouco importa. “Nunca foi minha intenção ser famosa na internet e ser reconhecida na rua. Mas, aconteceu”.

Renatinho tem 16 mil "fãs". E recebe presentes de várias delas.

Muita gente os segue na internet. E cada um desses seguidores tem seus próprios seguidores. Eles formam uma rede de contatos.

Por isso, fazem de tudo para estar sempre bem na fita. “O importante é estar maquiada, o importante é estar com o cabelo bonito, o importante é estar com uma roupa legal”, diz Yasmin.

Renatinho: Eu gosto de comprar roupa, tênis, boné. Eu sempre procuro estar cortando o cabelo toda semana, sobrancelha.

Fantástico: Então, esse aí é teu armário?
Juan: Esse aqui é o meu.
Fantástico: É muita coisa, né?
Juan: Bastante coisa.

Há cerca de cinco anos, os pais de Juan abriram um negócio próprio, uma loja de material de construção.

Quando não está no colégio, ele trabalha lá como vendedor. Compra tudo com seu salário de cerca de R$ 1 mil.

“Ele não precisa ajudar em casa. Ele não precisa guardar dinheiro pra isso. Então, ele quer se vestir bem, ter as fãs dele, deixa ele gastar dinheiro com as coisas que ele quer”, diz Cintia Mesquita, mãe de Juan.

“Aparência é tudo hoje em dia”, defende o pai do menino.

De vez em quando Renatinho faz uns bicos de cobrador de lotação. Mas é o pai quem faz de tudo para ele ficar na moda.

Fantástico: Como você se sente quando compra uma roupa de marca para o seu filho?
Marlisson: Eu me sinto superorgulhoso de mim mesmo. Porque eu batalho para dar as coisas para ele. Batalho, tenho que suar para comprar. A única coisa que eu peço pra ele é o quê? Estudar, ser bem educado com o pessoal aqui em casa e na rua.

Essas famílias melhoraram de vida na última década. São pais que agora podem dar o melhor para os seus filhos. E dão.

“É uma forma de dizer assim. Nós conseguimos subir, nós conseguimos ascender, estamos conseguindo comprar um tênis de R$ 1 mil. Mas, estamos conseguindo ter 17 anos e já estar no colegial, ter um projeto de fazer faculdade, essas coisas vêm juntas”, diz a antropóloga Silvia Borelli,.

O consumo aumentou. O número de shoppings também. Em 2000, eram 280 no Brasil. Hoje são 495. A juventude que despertou para o consumo encontrou no shopping seu templo.

“A proposta do shoppings é venham para cá, fiquem aqui, ocupem esse espaço, nós oferecemos lazer, nós oferecemos consumo de qualidade, nós oferecemos espaço pra vocês estarem junto”, avalia a antropóloga.

Fantástico: O shopping é o lugar que você mais gosta de ir?
Renatinho: É, de sábado à tarde assim eu gosto bastante.

Eles sempre frequentaram o shopping. E, quando ficaram famosinhos, começaram a convidar suas fãs.

“A gente falou: ah, vamos fazer um encontro de fãs, porque muitas fãs moram longe e não tem a oportunidade de vir aqui e conhecer a gente, tirar foto. Aí a gente simplesmente postou: encontro de fãs no shopping Ibirapuera tal dia. Aí elas estavam lá quando a gente chegou. Umas cinquenta mais ou menos, no primeiro”, lembra Juan.

Juan e muitos outros famosos da internet faziam esses encontros. Todo mundo queria participar.

“Muita gente não gosta desses encontros de fãs. Falam que a gente não é famoso, que é isso, que não é aquilo. Aí lançaram o rolezinho”, explica.

O rolezinho era como uma festa - com convite aberto na internet. “Estava escrito lá na descrição pra fazer amizade novas, pra conhecer umas meninas, tirar foto. Aí todo mundo foi”, lembra Renatinho.

No dia 7 de dezembro, no Shopping Itaquera, na Zona Leste de São Paulo, apareceram seis mil pessoas para o primeiro rolezinho. Funcionários e clientes, assustados, se trancaram nas lojas. Muita correria. Ninguém sabia direito o que estava acontecendo. O shopping fica bem ao lado da estação de metrô. A Polícia Militar entrou com motos para tentar conter o tumulto.

“E foi gente que ia só na intenção de roubar, tinha gente que foi na intenção de tirar foto, tinha gente de todo tipo lá. Foi o shopping mais lotado que eu fui, tinha muita gente”, diz Juan.

Depois desse dia, aconteceram vários outros rolezinhos na capital e Região Metropolitana de São Paulo.

No dia 14 de dezembro, no Shopping Internacional de Guarulhos, a confusão foi gravada com um telefone celular de dentro de uma loja. Dezenas de pessoas passam correndo diante das vitrines. Logo depois, vêm os seguranças tentando expulsar os jovens.

No dia 22 de dezembro, algumas lojas e o cinema do Shopping Interlagos fecharam. Uma foto mostra policiais com cassetetes no meio dos corredores.

O shopping Fiesta foi o primeiro a tomar providências para tentar conter os rolezinhos. No dia 30 de dezembro, não deixou entrar menores de 18 anos desacompanhados.

Depois disso, a Justiça concedeu uma liminar favorável ao shopping JK Iguatemi, que proibia o evento marcado para acontecer no dia 11 de janeiro sob pena de multa de R$ 10 mil por participante.

Essa liminar levantou o debate sobre discriminação. “Quais serão os critérios de seleção? A roupa que veste, a cor da pele, enfim, ter ou não ter uma aparência de funkeiro, ter ou não ter uma aparência de pagodeiro, é muito difícil”, avalia a antropóloga.

No dia 11 de janeiro, fim de semana passado, o rolezinho voltou a acontecer no Shopping Itaquera, onde tudo começou.

Imagens exclusivas obtidas pelo Fantástico mostram o corredor lotado. De repente, começa o tumulto. Os lojistas de um quiosque protegem a mercadoria. Na praça de alimentação, pais desesperados correm com seus filhos.

No meio da confusão a polícia reagiu com violência. Com um cassetete, um policial bateu em uma das pessoas na escada rolante. Usou armas de efeito moral.

O governador Geraldo Alckmin disse que só deve atuação da polícia, em casos de depredação.

“Nós entendemos que é um fenômeno cultural. Não é caso de policia. Caso de polícia é se houver depredação, aí é diferente, mas rolezinho, não”, declara o governador.

“O fato em si já se torna cultural e político, o impacto que esses meninos estão provocando, mesmo que a gente pergunte pra eles e eles respondam: ‘ah, eu quero zoar, eu quero dar uns beijos’, mas o que eles provocam é sem dúvida uma inserção cultural, uma questão no debate sobre a questão urbana”, destaca a antropóloga.

Depois desse dia, vários shoppings conseguiram liminares para proibir os rolezinhos. Todas preveem pena de multa.

O jurista André Ramos Tavares explica que os shoppings podem proibir a entrada, desde que haja um critério seja legítimo: “Então, por exemplo, só permitir o ingresso de menores de 18 anos acompanhados. Isso é uma medida legítima em um estabelecimento privado, desde que se aplique a todo mundo e seja uma regra prévia e conhecida. Se ela passar a ser aplicada só a determinadas pessoas, ela vai se tornar uma discriminação”.

Diante da repercussão, a Associação dos Shoppings resolveu que agora vai agir de forma preventiva cada vez que um rolezinho for marcado.

“Então, esse jovem não precisa ir pra comprar não. Se ele quiser passear no shopping, ele pode ir à vontade. Agora, se eu detectar que ele está lá fazendo alguma baderna eu tenho direito de tirar seja ele jovem, seja velho ou seja quem for. Não tem uma fórmula mágica. Tem um conjunto de ações, que a gente tem que ir trabalhando, inclusive, convencendo a esses garotos que ninguém tem nada contra eles não. A gente quer que eles venham para nós, desde que venham de forma organizada”, defende Luiz Fernando Veiga, presidente da Associação Brasileira de Shoppings Centers.

A discussão levantada pelos rolezinhos gerou protestos. Nos sábado (18), 200 manifestantes ficaram em frente ao shopping JK Iguatemi, em São Paulo. O shopping fechou as portas.

Em Niterói, no Rio, também houve protesto dentro do Plaza Shopping. Um grupo de 40 jovens percorreu os corredores acompanhados por seguranças. Muitos lojistas baixaram as portas.

Cerca de 20 adolescentes entraram juntos no shopping Metro Tatuapé, em São Paulo. Eles cantaram e bateram palma.

O shopping espalhou pela área externa comunicados informando que conseguiu uma liminar na Justiça proibindo os rolezinhos. Quem desrespeitasse a decisão da Justiça poderia pagar uma multa de R$ 10 mil.

No Parque Ibirapuera cerca de 50 jovens se reuniram para tirar fotos.

Nem Renato, nem Juan, nem Yasmin participaram dos últimos rolezinhos. Os pais não deixaram.

“Tem um ou outro que sempre aproveita pra fazer uma bagunça e acaba sobrando pra quem não tem nada a ver, entendeu”.

“A gente está aqui para conversar, para se conhecer, para tirar umas fotos. E não, tem uns que vem aqui pra se aproveitar disso. Eu acho isso ridículo, de verdade”, afirma a jovem.

Enquanto isso eles continuam de férias. Cheios de tempo livre pra inventar coisas novas.



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