Justiça
O MTST E A REPÚBLICA
FOLHA.COM 03/07/2014 02h00
José Police Neto
Em uma passagem marcante de "Os Sertões", Euclides da Cunha destaca que a pregação em Canudos em relação à República não era uma posição ideológica ou política, mas a incapacidade de multidões, excluídas dos direitos sociais e do processo político, de se enxergarem no conceito abstrato da coisa pública.
Passado mais de um século, Canudos ressurge justamente quando Guilherme Boulos, a liderança-celebridade do MTST, vai à Câmara Municipal e à imprensa para afirmar que "nem a pau" seus liderados se submeterão às regras da fila de inscrição dos programas públicos de moradia e aos processos republicanos determinados em lei para definir quem será atendido.
Até a semana passada, o MTST defendia com unhas e dentes que fosse dado à Construtora Viver, proprietária da área ocupada em Itaquera, na zona leste de São Paulo conhecida como Copa do Povo, o enorme benefício econômico da valorização do terreno por meio da mudança de zoneamento.
Boulos fere o Plano Diretor projetado por quem o apoia ao ignorar um de seus conceitos-base: o de moradia popular perto do trabalho, dos serviços e dos corredores de transporte público –de preferência, em áreas centrais. Ignora que, com esse foco, a prefeitura resgatou –quiçá com novo nome– o programa Renova Centro, lançado na gestão Gilberto Kassab, que previa desapropriar mais de 50 prédios desocupados para moradia popular.
O preço da minha insistência em seguir as normas legais foi enorme. Houve tentativa de atear fogo a um boneco meu, e a cidade foi coberta com caros cartazes em papel de alta qualidade destinados a difamar meu nome. Fui atacado de todas as formas. Optei por suportar o peso do insulto a curvar-me, como os demais, a um líder que desconhece as leis e a minha trajetória política, dedicada ao direito à moradia popular e à construção de uma cidade justa.
Ironia da história, coube justamente a mim –o parlamentar vilipendiado por ser um dos poucos a não se curvar ao MTST– oferecer a formulação legal que permitirá a solução do problema de forma republicana. O projeto de lei de 2011 sobre retrofit social, de minha autoria, que prevê que edifícios abandonados ou subutilizados sejam transformados em habitação social, recebeu um artigo que garante a construção de moradias populares no terreno de Itaquera.
Em momento algum a virulência do ataque difamatório do MTST à minha história pesou contra a decisão de resolver o impasse. O homem público de que a República precisa toma decisões à luz da razão e da busca pelo que é melhor para a cidade.
Na última sexta-feira, quando tudo parecia resolvido, mais uma vez a liderança-celebridade do MTST tentou impor uma cláusula ao projeto permitindo ao movimento "furar a fila" da moradia. Boulos só baixou a guarda ao saber que a Justiça iria anular a eficácia da medida, caso houvesse chance para tal malandragem, por ser esta uma flagrante irregularidade. Finalmente, vereadores aprovaram submeter a decisão da demanda às normas legais e ao foro apropriado, o Conselho Municipal de Habitação.
O processo de aprovação da Copa do Povo, tal como foi construído, mostra que, ao contrário do que pregava Antônio Conselheiro em Canudos, a multidão é capaz, sim, de se inserir nas normas republicanas. O que aprovamos não foi a Copa do Povo do Boulos, mas a Copa do Povo Brasileiro.
JOSÉ POLICE NETO, 41, é vereador (PSD) e membro da Comissão de Política Urbana da Câmara Municipal de São Paulo. É autor da Lei municipal da Função Social da Propriedade
*
loading...
-
Descumprimento De Ordens Judiciais
O confronto de sempre - O Estado de S.Paulo - 18/01/2012 O descumprimento de decisões judiciais por parte de movimentos sociais - especialmente na execução de ações de reintegração de posse - tornou-se uma rotina nos anos eleitorais. Para acuar...
-
Sem-teto De Todo O Mundo, Uni-vos
O GLOBO 14/05/2014 Elio Gaspari Ouvir o que diz o MTST pode não resolver o problema habitacional das grandes cidades, mas ajuda a discuti-lo Três dirigentes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto produziram um artigo intitulado “O que quer o MTST?”....
-
Atitude IrresponsÁvel
O Estado de S.Paulo 02 de maio de 2014 | 2h 06 OPINIÃO É lamentável constatar que as violentas manifestações promovidas terça-feira pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) diante da sede da Câmara Municipal e imediações tiveram...
-
ViolÊncia Em Protestos É Modelo Importado
JORNAL DO COMÉRCIO 26/02/2014 - 13h41min Violência em protestos é modelo importado, diz Carvalho O ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, afirmou nesta quarta-feira (26) que há uma "importação" de um modelo de violência...
-
Casa PrÓpria Continua O Sonho, Mas EstÁ Cara
JORNAL DO COMERCIO 16/05/2013 EDITORIAL Quem passou dos 50 anos sabe bem a história do Banco Nacional de Habitação, o famoso, então, BNH. Criado em 1964, o BNH era um banco de segunda linha, ou seja, não operava diretamente com o público. Sua função...
Justiça