Justiça
FALÊNCIA MÚLTIPLA DOS ÓRGÃOS
Falência múltipla dos órgãos. Cercado de favelas com tráfico, hospital fechado põe em xeque políticas de segurança, saúde e habitação - 30/06/2011 às 23h42m; Gustavo Goulart.
RIO - Primeiro foi a violência das favelas no seu entorno, na década passada. Depois, a debandada dos médicos, que tinham medo de ir trabalhar. As portas fechadas, desde 2008, abriram caminho para o abandono, a depredação e a construção de barracos nos fundos do terreno, que agora estão tomados por dezenas de casas de tijolos.
O fracasso das políticas de segurança, saúde e habitação faz do antigo Instituto Estadual de Infectologia São Sebastião, no Caju, um hospital condenado à morte - por falência múltipla dos órgãos. Em 2002, durante a epidemia de dengue, no entanto, o instituto desempenhou um trabalho fundamental no combate à doença: fez mais de dois mil atendimentos, sem que houvesse uma só morte.
A maior ameaça ao São Sebastião é a favela Parque Ladeira dos Funcionários, vizinha ao terreno. Os imóveis nos fundos do hospital, aparentemente recém-construídos, têm caixas d'água novas. Mais de 50 casas foram erguidas junto ao muro da vila militar do Arsenal de Guerra do Rio, unidade do Exército. Casas de até três pavimentos foram construídas. Além disso, um dos pavilhões do lugar foi todo saqueado: foram levadas peças como telhas e janelas, entre outros itens.
Apesar desse quadro, uma empresa de segurança toma conta do hospital, instalado num terreno com cerca de 20 mil metros quadrados. A vigilância para evitar invasões custa à Secretaria estadual de Saúde R$ 9.800 mensais.
O imóvel, histórico, foi inaugurado por dom Pedro II em 9 de novembro de 1889, num dos últimos atos do Império, já que a Proclamação da República aconteceu logo depois, no dia 15. Para o arquiteto Fábio Bittencourt, presidente da Associação Brasileira Para o Desenvolvimento do Edifício Hospitalar (ABDEH), trata-se de um patrimônio histórico hospitalar de valor inigualável no Brasil.
O superintendente de Serviços da Secretaria de Saúde, Alexandre Nascimento, que cuida da manutenção dos prédios do órgão, esteve terça-feira nas imediações do instituto e alegou que precisará consultar a Divisão de Engenharia, para saber o tamanho exato do terreno e confirmar se houve mesmo invasão. Moradores e trabalhadores das imediações do hospital, no entanto, afirmaram ao GLOBO que as invasões acontecem sem parar.
- Daqui a pouco, as casas estarão na beira da Rua Carlos Seidl (onde fica o instituto). Elas não param de avançar - disse um morador da área.
Arquitetura baseada em modelo inglês
O instituto foi referência no tratamento de doenças infectocontagiosas e o primeiro a ser construído na forma de pavilhões - modelo originário da Inglaterra, no século XVIII, segundo Fábio Bittencourt -, separando pacientes por doenças, além de crianças e mulheres dos demais internos. O setor de doenças infectocontagiosas, de acordo com a Secretaria de Saúde, foi transferido para o Instituto de Assistência dos Servidores do Estado do Rio (Iaserj). Para Bittencourt, a localização do hospital fez com que "ele seguisse o caminho do abandono":
Reuniram-se todos os componentes para estabelecer sua degradação: o cemitério simbolizando a morte, a violência do tráfico e o lixo da Comlurb.
- Com a construção do Cemitério São Francisco Xavier (Caju), a expansão vertiginosa da favela Parque Alegria e o isolamento causado pela Avenida Brasil e pela Linha Vermelha, o hospital não tinha como sobreviver. Isso tudo causou uma desvalorização muito grande no bairro. Reuniram-se todos os componentes para estabelecer sua degradação: o cemitério simbolizando a morte, a violência do tráfico e o lixo da Comlurb (há um centro de tratamento de resíduos na área).
Segundo um PM que trabalha na região, uma das favelas da área, a São Sebastião, é dominada pela mesma facção criminosa que controla a Rocinha. Ele disse que traficantes usam o hospital como refúgio, apesar de a unidade ter vigilantes. O PM revelou ainda que usuários de crack consomem a droga dentro do terreno.
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