ESPECIALISTAS DISCORDAM DA LINHA OFICIAL DA EXTREMA POBREZA
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ESPECIALISTAS DISCORDAM DA LINHA OFICIAL DA EXTREMA POBREZA




LUCAS SAMPAIO, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA - Danilo Bandeira/Editoria de Arte/Folhapress - FOLHA ONLINE, 26/07/2011

O único consenso entre especialistas sobre qual é a definição de miséria é o de que não existe consenso sobre o assunto.

"Para pesquisador da USP, miséria é definida pelo acessso à rede de esgoto"

Ao criar uma linha oficial para monitorar a extrema pobreza e fixá-la em R$ 70 por mês por pessoa do domicílio, o governo colocou em evidência um assunto que há décadas é debatido no Brasil.

A maioria dos especialistas ouvidos pela Folha é crítica à linha estabelecida em maio deste ano.

"Todos os estudos do governo de agora em diante serão realizados a partir dela", afirma o diretor do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) Jorge Abrahão de Castro.

Até os mais críticos à metodologia escolhida, como o professor de relações internacionais da USP José Eli da Veiga, dizem ser positivo o governo ter estabelecido um critério.

"Concordo que é um avanço ter uma linha. Também concordo que é mérito do governo Dilma, pois sob Lula houve oito anos de tergiversações."

A divergência, no entanto, não está na criação da linha, mas no critério e no valor utilizados.

"A linha mascara o que é a miséria para tentar fazer com que a sociedade acredite que ela foi exterminada em quatro anos", afirma o professor de relações internacionais da USP José Eli da Veiga.

Para o economista responsável pelo Centro de Pesquisas Sociais da FGV (Fundação Getúlio Vargas), Marcelo Neri, a crítica que se pode fazer à linha é que seu valor é baixo. "Mas buscar o mais pobre dos pobres é combinar efetividade social e fiscal."

Estudo da FGV mostra que se o valor da linha dobrasse, o custo para erradicar a miséria no Brasil até 2014 aumentaria cinco vezes.

O economista Flavio Comim, professor de economia da pobreza na UFRGS e pesquisador na Universidade de Cambridge, na Inglaterra, avalia a estratégia do governo: "Focar no extrato mais miserável da população é uma grande virtude do plano contra a miséria."

DIVERSIDADE REGIONAL
Contrário à criação de uma linha oficial, o pesquisador do Iets (Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade) Simon Schwartzman diz que não tem sentido ter uma linha geral.

Para o ex-presidente do IBGE, é necessário estabelecer critérios de pobreza para programas específicos e levar em consideração diferenças regionais.

"Uma coisa é ganhar R$ 1.000 em São Paulo, outra é ganhar R$ 1.000 no Acre", diz o coordenador de divulgação do Censo em São Paulo, Wagner Silveira. "Dizer que os dois estão na mesma classe social não é verdade."

OUTROS CRITÉRIOS

Se comparada a outras linhas existentes, como a dos EUA e da União Europeia, os R$ 70 brasileiros colocam o país no patamar dos subdesenvolvidos.

É considerado pobre na Europa quem possui renda menor a 60% da mediana nacional. Nos EUA, quem recebe menos do que três vezes o valor da cesta de alimentos que correspondente à dieta oficialmente recomendada.

O governo federal alega que a linha brasileira é muito próxima à do Banco Mundial, adotada pela ONU nos Objetivos do Milênio: US$ 1,25 dólar por dia ajustado pelo poder de paridade de compra de cada país.

Comim, que foi coordenador do relatório de desenvolvimento humano 2009/2010 do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), discorda.

O professor da UFRGS e pesquisador de Cambridge diz que o consenso que existe é que a linha de US$ 1,25 é válida para a África e alguns países da Ásia. Para a America Latina, US$ 2.

Tereza Campello, ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, defende o critério adotado. Ela diz que o setor público precisa de um critério simples para funcionar. "Por mais que seja imperfeito, em geral quem é pobre de renda é pobre de outras coisas também."



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