Justiça
DO ABSOLUTISMO, DA INTOLERÂNCIA E DA SUBMISSÃO
ALBERTO AFONSO LANDA CAMARGO - Professor graduado em Letras e Filosofia, Bacharel em Direito e Coronel da Brigada Militar.
“
...o triunfo na política só pertence a quem é brutal e intolerante; a massa, à semelhança de uma mulher, tem horror aos fracos, aos tíbios; submete-se ao homem forte, inflexível, fanático, que causa medo, que aterroriza.” (Jean-Jacques Chevallier, in “As grandes obras políticas - de Maquiavel a nossos dias)
Não é de agora que a luta pelo poder se desempenha brutal e, por isto, injusta quer na sua condução, quer nos seus objetivos. A compreensão de Adolf Hitler, conforme citação acima retirada da famosa obra de Jean-Jacques Chevallier, está praticamente expressa nela.
A condução ao absolutismo e o uso da força, qualquer um sabe, nunca foi coisa dos dias de hoje, mas indubitavelmente quem assim se comporta rebusca-se em grandes figuras que o arbitraram há séculos atrás para chegar ao poder. Em 1576, Jehan Bodin já dava as linhas pelas quais o tirano deve se seguir, colocando o governante como alguém que se deveria comportar como detentor de um poder divino, portanto infalível:
“a primeira característica do príncipe soberano é o poder de dar lei a todos em geral e a cada um em particular... sem o consentimento de quem quer que seja, maior, igual ou menor: pois, se o príncipe está obrigado a não promulgar lei sem o consentimento de um maior, é verdadeiro súdito; se de um igual, terá sócio; se dos súditos, quer do senado, quer do povo, não é soberano”.
E Jehan Bodin ia mais além ao definir que o povo não tem vontade e se deve submeter ao pensamento e ao interesse do soberano: “A lei pode abolir os costumes, e o costume não pode derrogar a lei”.
A tudo isto sempre está atento o absolutista. Porém, compreende que é importante, tal como pensava Adolf Hitler, ser forte, brutal e causar terror, porque somente isto, pensa, é capaz de submeter a massa e esta, evidentemente, comporta-se como algo irracional, facilmente sugestionável e dotada de exemplar simplismo, sendo, por isto, que precisa de alguém com capacidade de dominá-la e conduzi-la conforme os interesses da elite dirigente. Gabriel Tarde, um clássico da psicologia de massas, chega a argumentar que “as multidões não podem ter nenhum poder político, pois sempre seguirão um líder inadequado e tendem a optar pelas piores sugestões e pelas idéias mais ‘contagiosas’, ou seja, aquelas ‘falsas’ e ‘egoístas’”.
E pela falta de vontade e incapacidade de reação, as massas submetem-se incontinenti ao absolutista, repetindo à exaustão que “é complicado” contrariar os interesses daquele líder, mesmo sabendo da sua inadequação à democracia, ao direito e à justiça.
A modernidade tem trazido à balha uma forma bem mais simples de controle de multidões. Como sabemos, grupos sociais que exercem uma determinada profissão reúnem-se em sindicatos e associações. Isto constituiu-se num achado para os absolutistas, eis que este não precisa mais demonstrar sua brutalidade ou aterrorizar as multidões como um todo tal como acontecia lá nos tempos de Jehan Bodin e de Adolf Hitler.
Hoje é suficiente amedrontar o líder inadequado de determinada entidade associativa, o qual, pela sua falta de vontade e inclinação a outros interesses que não os da democracia e da justiça, aceita ser conduzido em forma, fazendo, sem qualquer resistência, os movimentos da ordem unida que conduzem o destino daqueles que se submetem a uma escravidão voluntária porque não são capazes de exercer a própria vontade, submissos que estão ao arbítrio dos interesses dos que os dominam.
E enquanto o homem massa existir, seja perdido em meio às multidões, seja ele unicamente eleito para pretensamente dirigir alguma entidade, continuaremos a ter nessa figura a negação do próprio homem e da sua liberdade. Tudo para deleite daqueles que se têm como “fortes, inflexíveis, fanáticos e capazes de causar medo e terror”...
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