BUROCRÁTICA - FALHA FAZ JUSTIÇA ANULAR CONDENAÇÃO E SOLTAR DUPLO-HOMICIDA
Justiça

BUROCRÁTICA - FALHA FAZ JUSTIÇA ANULAR CONDENAÇÃO E SOLTAR DUPLO-HOMICIDA


Troca de promotor anula julgamento. Falha burocrática leva Justiça a anular condenação por duplo homicídio - JOSÉ LUÍS COSTA, Zero Hora, 04/12/2010

Uma decisão do Tribunal de Justiça do Estado, invalidando o júri e mandando soltar o réu de um dos crimes mais chocantes do Rio Grande do Sul em 2009, gerou mal-estar entre integrantes do Ministério Público (MP) e do Judiciário. O júri que condenou Marcos Adilon Cunha de Freitas a 32 anos e meio de prisão por assassinar um empregado e seu filho de 12 anos, em Encruzilhada do Sul, foi anulado.

Freitas esteve preso por 11 meses, mas foi solto em setembro com a anulação do júri e segue vivendo na cidade.

O motivo da anulação é a atuação no julgamento de um promotor estranho à comarca do local do crime, Eugênio Amorim, do Tribunal do Júri de Porto Alegre, que não teria sido regularmente designado. O MP sustenta que a participação de Amorim foi legal e entrou no TJ com recurso extraordinário para ser remetido ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A substituição foi determinada porque a promotora Brenusa Corleta, de Encruzilhada, estava nos últimos dias de gestação, não tendo condições físicas de atuar em um júri, que se previa longo e cansativo (durou 10 horas).

Por meio de uma portaria da Subprocuradoria-geral para Assuntos Institucionais, Amorim foi designado para a acusação. O documento foi datado em 13 de abril, mesmo dia do júri, mas só foi anexado ao processo depois do julgamento, por uma falha do MP.

O acórdão também cita a posição da defesa, que levantou suspeitas sobre a real incapacidade da promotora de Encruzilhada em atuar no júri, pois ela estaria em plena atividade antes e após o julgamento.

– Esse argumento é ridículo. Entre assinar papéis e fazer um júri há uma distância enorme. O TJ é muito bom, a 1ª Câmara funciona bem, mas o que aconteceu é um grande absurdo – revolta-se Amorim, que tem a solidariedade de colegas do MP.

Amorim admite ter ocorrido um erro da Subprocuradoria no envio da portaria, mas diz que um simples fax esclareceria a questão.

– O pior de tudo não foi anular, mas sim soltar o réu – reclama o promotor.

O CRIME - Em 17 de outubro de 2009, os corpos de Aderci Lacerda de Moura, 35 anos, e o filho Anderson, 12 anos, foram encontrados baleados e queimados dentro do Celta da família em Encruzilhada do Sul. Com as vítimas, estava o patrão de Moura, Marcos Adilon Cunha de Freitas, 37 anos. À polícia, ele contou que os três teriam sofrido um assalto e que ele teria conseguido fugir, embora baleado na perna. De testemunha, Freitas passou a suspeito ao longo da investigação. Ele teria uma desavença com Moura por causa de uma mulher, e armado uma cilada para o empregado e seu filho.

CONTRAPONTO - O que diz o desembargador Manuel José Martinez Lucas, relator do processo - “Questionei a regularidade da portaria. Ela apareceu bem depois do júri, em maio, após o recurso da defesa. Concordo que um júri é bem diferente de assinar documentos, pois não causa problemas a uma gestante, mas se tivesse uma manifestação prévia, solicitando designação de substituto, aí tudo estaria regular. Até o momento do julgamento no recurso no TJ, não existia nada nos autos. Normalmente, não concebemos habeas corpus, mas soltei o réu por excesso de prazo. O ideal é que isso não tivesse acontecido. Esse recurso pode levar anos para ser julgado, e um réu não pode ficar preso sem culpa formada por muito tempo, e já ficou preso por 11 meses”.



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